sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
O arco-íris e a flor apressada
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
Dias de inverno
Lá fora a cor dos dias mantém-se igual. Monótona. Atravessada de quando em quando por finas gotas de água que se derramam pelo chão. Abanada pelo sopro inquieto do vento. Viro-lhe as costas. Instalo-me ao fogão e decido reabastecer a lata de bolachas com broas de café. Consulto uma vez mais a receita da prima D. São
Todas não, deixo aqui umas quantas. Podem servir-se.
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
Combater o cinzento do dia
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
Em modo Natal
domingo, 19 de dezembro de 2010
sábado, 18 de dezembro de 2010
A cabine telefónica
Acho que a partir do momento em que o homem passou a dispor de um membro suplementar – o telemóvel – foi-se esquecendo da cabine telefónica. Até nem sei se alguém ainda dá uso a essas estruturas, provavelmente em vias de extinção. Na verdade, para que servem hoje as cabines telefónicas?
No entanto lembro-me de um tempo em que nem sequer telefone fixo havia na minha casa. Às vezes fico a pensar em como era possível viver sem telefone. Mas vivia-se. E bem. Então sim, uma cabine telefónica por perto fazia todo o sentido. Uma houve que não mais me sairá da memória.
Vivíamos, eu e os meus pais, os últimos dias de emigração em França quando precisei de fazer uma chamada telefónica relacionada com qualquer trâmite burocrático do nosso regresso a Portugal. Eu tinha 16 anos e, nessa tarde de um Sábado de Junho cinzento, dirigi-me à cabine telefónica quer se encontrava na “Place Carnot”, onde às Quartas-feiras se realizava um mercado semanal. Naquele Sábado à tarde a praça estava absolutamente vazia. A cabine telefónica tinha uma daquelas portas articuladas como um fole, mas só com duas partes. Quando acabei de fazer a minha chamada quis sair da cabine mas nem por nada consegui abrir a porta. Tentei. Voltei a tentar. Fiz força. Nada. O tempo passava. Só não passava ninguém pela praça que me pudesse acudir. Em desespero, agarrei numa moeda e liguei o número de emergência. Passados alguns minutos, chegou um carro de bombeiros piscando. Parou no cruzamento e saiu de lá um dos homens que se dirigiu à cabine e, com a maior das facilidades, me abriu a porta. Era só uma questão de jeito. E eu só queria ter podido desaparecer da face da terra tal a vergonha e o incómodo que senti naquela situação.
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
Verdes são os campos
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
Atracção fatal
O meu cotovelo direito tem uma atracção fatal por toda e qualquer superfície dura da qual se aproxime. Não há dia e, em certos dias, quase não há hora em que não se encoste dolorosamente, para mim, a uma parede, à quina de uma porta, a um puxador, a uma gaveta aberta. São tantas as batidas deste meu cotovelo que já trato por tu as mil estrelas que dançam ao redor de mim de cada vez que ele não resiste a mais um destes encontros repentinos. Ainda gostava que alguém me conseguisse explicar este fenómeno. Será, por certo, um problema da física que ainda se encontra por resolver. Ou será antes um mistério da metafísica? Certa, certa, é a dor que não posso dizer que seja de cotovelo, mas que é, sem dúvida, no cotovelo.
domingo, 12 de dezembro de 2010
sábado, 11 de dezembro de 2010
sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
Modo de espera
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Arte e compras
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
A culpa não é do tempo
Por muito que eu me queixe da falta de tempo, a culpa não é do tempo. Não é ele que está
Não, a culpa não é do tempo.
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Dactilografia
Na época, eu estava a terminar o secundário e ainda não sabia muito bem qual seria o meu futuro. Havia que assegurar a aquisição de competências que me permitissem com maior facilidade arranjar um bom emprego e, claro, a dactilografia surgia como essencial. Em 1980, eu nem sonhava com o computador, amigo inseparável de hoje em dia.
Então no verão de 1980, lá ia eu de comboio para Faro, aprender a escrever à máquina com todos os dedos das mãos. Fui treinar tabelas, actas em papel azul de 25 linhas, cartas oficiais, facturas e recibos. Fiquei apta, com 16 valores.
O meu curso de dactilografia da Contecla ainda me terá servido para elaborar os trabalhos da faculdade e, no início da minha vida profissional, para fazer alguns ofícios e comunicados que se compunham sob a batida cadenciada das teclas da máquina de escrever. Depressa chegariam os PC. Com o tempo fui deixando de aplicar as técnicas aprendidas e a minha aptidão resvalou para cerca de metade dos dedos disponíveis.
Hoje encontrei a minha pasta de exercícios de dactilografia, guardada nos fundos de uma mala de metal com os fechos enferrujados. Numa das folhas foi treinada a frase:
…nem todo o que escreve à máquina virá a ser um dactilógrafo…
Pois é. E eu, nem mesmo aprendendo a escrever à máquina com técnica, me tornei dactilógrafa.
domingo, 5 de dezembro de 2010
sábado, 4 de dezembro de 2010
Uma ovelha de presépio para o Grande Concurso da Barbearia
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
José e Pilar (2)
Os patins
Houve um Natal em que ganhei uns patins. Eu devia ter uns dez ou onze anos e lembro-me que foi o presente que mais me desapontou em toda a minha vida. Acho que me desapontou muito mais do que aqueles presentes que ganhamos todos os anos, das tias. As camisolas de interior. As meias. Os lenços de assoar. Esses são presentes que nós já esperamos ganhar e que antes de os receber já estamos conformados com eles. Depois de os receber, então, até verificamos o jeito que dão em muitas ocasiões.
Mas no Natal em que eu tinha uns dez ou onze anos eu não gostei nada de receber uns patins. Acho que até chorei. A minha prima V. também ganhou uns iguais. Não me lembro se ela gostou ou não. Eram uns patins de quatro rodas, sob uma estrutura metálica de duas peças que encaixavam uma na outra permitindo ajustar a plataforma a vários tamanhos. Umas correias de cabedal apertavam sobre os sapatos segurando os patins aos pés. Que desiludida fiquei. Eu queria lá patinar. Medricas como era, nem me atrevia a calçá-los. Teria preferido uma Barbie. Mas nessa época nem pensar em fazer trocas. Tinham-me calhado uns patins e pronto. Só bastante mais tarde me lembro de os usar. Hoje até queria ter uns patins daqueles. Não que me visse agora a deslizar sobre rodinhas. Mas tenho saudades. Saudades de mim.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
A vida secreta dos objectos - O anjinho de Natal
domingo, 28 de novembro de 2010
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Este post não é para dietas
Eu, por exemplo, gosto de fazer sandes de chocolate. Coloco uma barrinha dentro de um papo-seco com manteiga e já está. Esse meu colega dos Dom Rodrigo surpreendeu-nos com a sua versão de sandes de banana. No que toca a fruta para comer com pão, eu sou mais uvas, mas também há quem opte por laranja.
A dado momento, alguém falou de uma “especialidade” que eu talvez prefira designar como “simplicidade” e que me lembro de comer quando criança. A lembrança instalou-se, insidiosa, nos fundos do meu pensamento e não descansei até que hoje me banqueteei com o tal lanche.
Cortei uma fatia de pão, barrei-a com manteiga e salpiquei-a de açúcar. Uma delícia.
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
O carro branco
O carro branco vinha mesmo atrás de mim. Na rotunda abrandei. O condutor do carro branco apitou-me de imediato. Impacientou-se com os breves segundos que levei para a redução da mudança. Detesto condutores de carros brancos ou de qualquer outra cor que apitam ao condutor da frente por tudo e por nada. Pelos vistos o condutor do carro branco estava com pressa. Antes de chegarmos à rotunda seguinte, ultrapassou-me. Mas a estrada mudou de figura e passou a ser uma daquelas vias relativamente estreitas. O trânsito estava denso. Em sentido contrário, os outros carros não proporcionavam qualquer abertura. O condutor do carro branco não conseguiu senão manter-se imediatamente à minha frente. Chegámos à rotunda seguinte e, ao mesmo tempo, ele virou para a esquerda e eu prossegui pela direita. Coitado do condutor do carro branco. Não ganhou a corrida.
José e Pilar
Divulgando o pedido deixado pelo Miguel na caixa de comentários do post anterior, deixo aqui a sinopse do filme que estreou na semana passada, que hoje se apresenta em Olhão e que no próximo Sábado, dia 27 de Novembro, será filme de abertura do Festival de Ronda (Espanha), onde será apresentado pelo Juiz Baltazar Garzón.
A Viagem do Elefante, o livro
Mostra do dia-a-dia do casal em Lanzarote e Lisboa, na sua casa e em viagens de trabalho por todo o mundo, José e Pilar é um retrato surpreendente de um autor durante o seu processo de criação e da relação de um casal empenhado em mudar o mundo -- ou, pelo menos, em torná-lo melhor.
José e Pilar revela um Saramago desconhecido, desfaz ideias feitas e prova que génio e simplicidade são compatíveis. José e Pilar é um olhar sobre a vida de um dos grandes criadores do século XX e a demonstração de que, como diz Saramago, "tudo pode ser contado de outra maneira".
Vale a pena também passar pelo site do filme.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Lua
domingo, 21 de novembro de 2010
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Une belle histoire
Hoje resolvi viajar no tempo e tenho novamente dez ou doze anos, por isso esta "musiquinha" não podia faltar.
terça-feira, 16 de novembro de 2010
A empreita
Os ramos de palma eram, primeiro, postos a secar. Pareciam pequenos leques que, depois, haviam de ser rasgados pelos dedos ágeis da avó que, com o polegar, separava cada fina folha da palmeira anã. Com o seu gesto brusco e firme, soltavam-se minúsculas partículas de pó que pousavam sobre a roupa preta que vestia, atenuando-lhe o luto com uma frágil película de cor bege.
Depois ainda era preciso demolhar a palma para que pudesse ser entrançada sem quebrar. Já não sei se era antes ou se era depois mas, na preparação da empreita havia também aquele momento fascinante para mim, criança, quando a avó colocava um pequeno pedaço de enxofre numa lata e lhe deitava fogo. Acho que era uma velha lata de graxa para sapatos. Uma chama azul tremia no ar por breves instantes, só o tempo da avó agarrar na lata com uma tenaz e a fechar num grande saco onde já estavam as folhas de palma para serem branqueadas.
Por fim, os dedos da avó começavam a trabalhar e era algo de mágico ver crescer aquela trança, mais ou menos larga consoante o número de hastes que se cruzavam umas nas outras. As tiras de empreita iam crescendo e ficavam arrumadas em rolos, até ao momento em que viriam a dar forma a uma alcofa. A avó, sentada na pequena cadeira de atabua, com um molho de palma enrolado num trapo velho humedecido, fazia empreita escolhendo com arte cada folha, ripando as mais largas com os dentes para que a tira fosse sempre crescendo certinha.
E a baracinha? Claro. Também havia que fazer a baracinha, o fio que servia para cozer as tiras de empreita.
Também eu fazia baracinha. E tinha jeito para a coisa. Enrolava a folha de palma à vota do dedo que servia de esticador no início do trabalho. Depois de algumas torcidas na folha, já podia soltar o dedo e continuar a torcer, acrescentando as folhas necessárias até a baracinha atingir o comprimento ideal.
Lembro-me também da agulha de cobre que guiava a baracinha por entre as folhas entrançadas da empreita. Era uma agulha gigante e achatada. Pergunto-me se ainda a encontrarei por aí, esquecida numa qualquer gaveta. É que há tanto tempo que ninguém faz empreita cá em casa.
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domingo, 14 de novembro de 2010
sábado, 13 de novembro de 2010
A alfarrobeira
Passo por ela todas as noites, na minha viagem diária até ao contentor do lixo que está na beira da estrada, um pouco mais à frente. Neste percurso, para lá e para cá, sinto-a sempre a estremecer. Sinto uma folha que cai. Sinto um ramo quebrar. Sinto que a vida anda por ali, solta… à espreita.
Hoje, ainda com a luz do dia, resolvi sair do asfalto e descer o pequeno declive de acesso ao seu território. E encarei-a. Agarra-se à terra com força. Com tanta força que até se contorce e retorce, mostrando cara de má. São séculos de vida que ali estão. E em cada pedaço de tronco retorcido devem estar mil histórias escondidas.
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
O telemóvel
Entrei na farmácia e ouvi a sua voz preenchendo o espaço. A mulher estava sentada num pequeno banco, ali mesmo ao lado do aparelho de medir a tensão arterial e frente ao expositor do calçado ortopédico. A seus pés alinhavam-se três ou quatro sacos de plástico cheios de compras. Ela encostava o telemóvel ao ouvido direito e falava, gesticulando com o braço esquerdo. O cabelo amarelado, comprido, baço e apanhado num rabo-de-cavalo, emoldurava a cara que apresentava mais sulcos do que terra lavrada, denunciando a idade adiantada e uma vida difícil. A farmácia estava praticamente vazia. Apenas uma cliente era atendida ao balcão. Eu passeava pela secção de cosméticos enquanto esperava que a minha colega levasse a vacina da gripe e ouvia toda a conversa da mulher que, indiferente ao local em que estava, falava alto contando a quem a ouvia do lado de lá do telemóvel as suas histórias de família. Falava do filho e da nora, do jantar do fim-de-semana, de zangas e de encontros inesperados. Falava alto e, de vez em quando, animada pelo curso da história que contava, soltava palavrões e impropérios. A mulher ocupava aquele banquinho da farmácia como se estivesse sentada no sofá da sua sala. E falava.
Ao fim de uns dez minutos, saí e ela lá ficou alimentando o seu assunto.
Eu fui pensando em que figuras um banal telemóvel nos pode colocar e em como a vida privada se pode escancarar numa qualquer rua, num qualquer café. Até numa farmácia.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
O sonhador
É obra do filho de uma colega minha.
Partilho aqui este sonho desenhado, que me pareceu um verdadeiro poema visual.
Prémio Dardos - Adenda
Devo também agradecer à Isa GT, que ainda antes deste que afixei aí abaixo, já me tinha destinado um, no seu sempre animado espaço, Doce ou Travessura?
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Intensamente
Intensamente.
Decido que é com essa palavra que vou decorar a minha semana. Vou grafitá-la nas paredes do meu pensamento para que, em cada dia, me recorde de a viver.
domingo, 7 de novembro de 2010
Prémio Dardos
“O Prémio Dardos é o reconhecimento dos ideais que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc.... que, em suma, demonstrem a sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre as suas letras e as suas palavras. Estes selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre blogueiros, uma forma de demonstrar o carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web.»
E devo ainda atribuí-lo a pelo menos dez outros blogs. E esta, para mim, é sem dúvida a parte mais difícil. Por um lado, muitos dos que eu gostaria de citar, já receberam estes Dardos. Por outro, sinto que vou sempre deixar alguém injustamente de fora desta minha escolha. Em todo o caso, não me vou agora acobardar e por isso, aqui vai, numa ordem perfeitamente aleatória:
sábado, 6 de novembro de 2010
A vida secreta dos objectos - A boneca pisa-papéis
A minha vida sempre foi de uma total transparência. Mal me criaram e prenderam-me logo neste grosso e pesado vidro absolutamente transparente. Nunca tive escapatória. Toda a minha vida estive nesta montra, visível a qualquer olhar. Não há cá segredos. Sou uma boneca pisa-papéis e pronto. Sou algarvia e todos podem comprová-lo pelo meu alegre traje. Aliás sou uma boneca pisa-papéis feita para turista levar para casa e recordar as suas férias portuguesas. No meu caso, não foi bem um turista que me levou. Foi uma menina emigrante que sempre que vinha de férias à sua terra era presenteada pelo seu tio Zé com alguma lembrança local. Ainda me lembro de um companheiro de prateleira que tive: um burrito de corda sintética e entrançada que carregava nos seus alforges coloridos uma ou duas amêndoas e uma alfarroba. Não sei o que terá sido feito dele. Não o vejo há séculos. Nem sei se terá resistido à viagem de regresso ao país de origem, com a confusão toda da mudança de vida. E na minha vida não há cá segredos. Também, sem me poder mexer nesta prisão de vidro… o que é que eu poderia fazer?
Tenho que ficar para aqui, estática, e nos últimos anos até vivo sem grande utilidade. Já nem vivo na casa da menina. Ela cresceu e mudou-se para a casa ao lado. Não me levou com ela.
Acho que de tão transparente que é a minha vida, até me tornei invisível. Hoje em dia já ninguém me vê. Fico parada, pousada sobre a arca de madeira do pai da menina que entretanto envelheceu. Nem para pisa-papéis já sirvo.
Às vezes sonho que a minha prisão de vidro se parte e que consigo fugir daqui. Sei lá… apesar da idade ainda me sinto leve e, por uma vez ao menos na minha vida, gostava de dançar um corridinho.
Publicado também para a Fábrica de Letras que, em Novembro, propõe o tema transparência.