Passeio com restos de chuva e algumas amendoeiras com pressa de florir.
Refém destes tempos confinados e do teletrabalho, retirei do congelador uns bifes de peru que haviam de servir para um almoço pouco elaborado e de rápida preparação. Na hora de os temperar e passar pela chapa, dou conta que de peru pouco tinham e de bifes ainda menos. Aqueles pedaços rosados, ainda agarrados uns aos outros eram afinal o que restou de um tamboril. Os lombos foram para a cataplana que fez as delícias de um almoço de domingo, vai para mais de algumas semanas. A cabeça, devidamente esquartejada, ficou de reserva no congelador, com recomendação da peixeira de que daria um excelente arroz. A contrarrelógio, alterei os planos do almoço, resumindo-o a um despachado esparguete. Assim, a cabeça do tamboril ainda precisou de esperar várias horas por mim, pela cebola, pelo alho, pelo pimento, pelo tomate, pelo azeite, pelos camarões, pelo arroz, pela salsa e pelos coentros. Mas a espera valeu a pena. Devo dizer que foi um ajuntamento bem sucedido, de risco devidamente calculado e de consequências prazenteiras.
Apropinquar.
Apropinquo, apropinquas, apropinquamos…
Foi o dicionário em linha que, agora mesmo, me deu a conhecer este vocábulo. Estava ali em destaque na secção de palavras caras, palavras raras. Põe rara nisto, pensei. Jamais me tinha apropinquado de tal. Cliquei pois na dita palavra e assim me apropinquei do seu significado. Por mim, rara continuará, que se me atropela a língua nos dentes e se me baralham as sílabas todas quando a pronuncio, para não falar da falta de destreza que me assalta os dedos ao tentar escrevê-la.
Enfim, talvez ainda lhe dê hoje um desconto, se à sua custa alguém se apropinquar deste postal inconsequente.
E assim, de novo em confinamento, fica o passeio limitado às imediações da casa. Perspetivam-se domingos monotemáticos.
Se uma palavra tua
dançasse com
uma palavra minha,
diz-me,
que dança seria?
Uma valsa, talvez.
Palavra a puxar palavra
no branco da folha
nas voltas sem fim
de uma fantasia.