domingo, 28 de novembro de 2010

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Este post não é para dietas

Há dias, um colega teve a esplêndida ideia de levar para o trabalho uns quantos merengues e uns Dom Rodrigo confeccionados por uma tia. Todos abençoámos a tia e tivemos um lanche especialmente doce e calórico que nos alegrou o dia e preencheu o intervalo com conversas relacionadas com a gulodice. Mas se eram bolos o que comíamos, acabámos por falar sobretudo de pão e de alguns “condutos” invulgares que cada um de nós gostava de lhe juntar.

Eu, por exemplo, gosto de fazer sandes de chocolate. Coloco uma barrinha dentro de um papo-seco com manteiga e já está. Esse meu colega dos Dom Rodrigo surpreendeu-nos com a sua versão de sandes de banana. No que toca a fruta para comer com pão, eu sou mais uvas, mas também há quem opte por laranja.

A dado momento, alguém falou de uma “especialidade” que eu talvez prefira designar como “simplicidade” e que me lembro de comer quando criança. A lembrança instalou-se, insidiosa, nos fundos do meu pensamento e não descansei até que hoje me banqueteei com o tal lanche.

Cortei uma fatia de pão, barrei-a com manteiga e salpiquei-a de açúcar. Uma delícia.



quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O carro branco

O carro branco vinha mesmo atrás de mim. Na rotunda abrandei. O condutor do carro branco apitou-me de imediato. Impacientou-se com os breves segundos que levei para a redução da mudança. Detesto condutores de carros brancos ou de qualquer outra cor que apitam ao condutor da frente por tudo e por nada. Pelos vistos o condutor do carro branco estava com pressa. Antes de chegarmos à rotunda seguinte, ultrapassou-me. Mas a estrada mudou de figura e passou a ser uma daquelas vias relativamente estreitas. O trânsito estava denso. Em sentido contrário, os outros carros não proporcionavam qualquer abertura. O condutor do carro branco não conseguiu senão manter-se imediatamente à minha frente. Chegámos à rotunda seguinte e, ao mesmo tempo, ele virou para a esquerda e eu prossegui pela direita. Coitado do condutor do carro branco. Não ganhou a corrida.

José e Pilar

Divulgando o pedido deixado pelo Miguel na caixa de comentários do post anterior, deixo aqui a sinopse do filme que estreou na semana passada, que hoje se apresenta em Olhão e que no próximo Sábado, dia 27 de Novembro, será filme de abertura do Festival de Ronda (Espanha), onde será apresentado pelo Juiz Baltazar Garzón.

A Viagem do Elefante, o livro em que Saramago narra as aventuras e desventuras de um paquiderme transportado desde a corte de D. João III à do austríaco Arquiduque Maximiliano, é o ponto de partida para José e Pilar, filme de Miguel Gonçalves Mendes que retrata a relação entre José Saramago e Pilar del Río.
Mostra do dia-a-dia do casal em Lanzarote e Lisboa, na sua casa e em viagens de trabalho por todo o mundo, José e Pilar é um retrato surpreendente de um autor durante o seu processo de criação e da relação de um casal empenhado em mudar o mundo -- ou, pelo menos, em torná-lo melhor.
José e Pilar revela um Saramago desconhecido, desfaz ideias feitas e prova que génio e simplicidade são compatíveis. José e Pilar é um olhar sobre a vida de um dos grandes criadores do século XX e a demonstração de que, como diz Saramago, "tudo pode ser contado de outra maneira".

Vale a pena também passar pelo site do filme.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Lua


Hoje não quero pensar.
Não quero falar.
Hoje só quero ver a lua.
Descansar nela o olhar.
Descansar os sentidos.
Adormecer como aquela criança, a quem mostram a lua... a madrinha lua.

domingo, 21 de novembro de 2010

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Une belle histoire

Hoje resolvi viajar no tempo e tenho novamente dez ou doze anos, por isso esta "musiquinha" não podia faltar.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

A empreita


Os ramos de palma eram, primeiro, postos a secar. Pareciam pequenos leques que, depois, haviam de ser rasgados pelos dedos ágeis da avó que, com o polegar, separava cada fina folha da palmeira anã. Com o seu gesto brusco e firme, soltavam-se minúsculas partículas de pó que pousavam sobre a roupa preta que vestia, atenuando-lhe o luto com uma frágil película de cor bege.


Depois ainda era preciso demolhar a palma para que pudesse ser entrançada sem quebrar. Já não sei se era antes ou se era depois mas, na preparação da empreita havia também aquele momento fascinante para mim, criança, quando a avó colocava um pequeno pedaço de enxofre numa lata e lhe deitava fogo. Acho que era uma velha lata de graxa para sapatos. Uma chama azul tremia no ar por breves instantes, só o tempo da avó agarrar na lata com uma tenaz e a fechar num grande saco onde já estavam as folhas de palma para serem branqueadas.


Por fim, os dedos da avó começavam a trabalhar e era algo de mágico ver crescer aquela trança, mais ou menos larga consoante o número de hastes que se cruzavam umas nas outras. As tiras de empreita iam crescendo e ficavam arrumadas em rolos, até ao momento em que viriam a dar forma a uma alcofa. A avó, sentada na pequena cadeira de atabua, com um molho de palma enrolado num trapo velho humedecido, fazia empreita escolhendo com arte cada folha, ripando as mais largas com os dentes para que a tira fosse sempre crescendo certinha.


E a baracinha? Claro. Também havia que fazer a baracinha, o fio que servia para cozer as tiras de empreita.


Também eu fazia baracinha. E tinha jeito para a coisa. Enrolava a folha de palma à vota do dedo que servia de esticador no início do trabalho. Depois de algumas torcidas na folha, já podia soltar o dedo e continuar a torcer, acrescentando as folhas necessárias até a baracinha atingir o comprimento ideal.


Lembro-me também da agulha de cobre que guiava a baracinha por entre as folhas entrançadas da empreita. Era uma agulha gigante e achatada. Pergunto-me se ainda a encontrarei por aí, esquecida numa qualquer gaveta. É que há tanto tempo que ninguém faz empreita cá em casa.

Partilhar histórias

Porque o Algarve também é uma história para partilhar, eu partilho o convite que nos faz o Turismo do Algarve.

domingo, 14 de novembro de 2010

sábado, 13 de novembro de 2010

A alfarrobeira

Ela está ali, mesmo ao lado, na terra do vizinho. Os seus ramos sempre carregados de folhas verdes formam uma copa imensa e os mais retorcidos pendem em direcção ao solo deixando, em certas zonas, o largo tronco meio escondido.

Passo por ela todas as noites, na minha viagem diária até ao contentor do lixo que está na beira da estrada, um pouco mais à frente. Neste percurso, para lá e para cá, sinto-a sempre a estremecer. Sinto uma folha que cai. Sinto um ramo quebrar. Sinto que a vida anda por ali, solta… à espreita.

Hoje, ainda com a luz do dia, resolvi sair do asfalto e descer o pequeno declive de acesso ao seu território. E encarei-a. Agarra-se à terra com força. Com tanta força que até se contorce e retorce, mostrando cara de má. São séculos de vida que ali estão. E em cada pedaço de tronco retorcido devem estar mil histórias escondidas.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

O telemóvel

Entrei na farmácia e ouvi a sua voz preenchendo o espaço. A mulher estava sentada num pequeno banco, ali mesmo ao lado do aparelho de medir a tensão arterial e frente ao expositor do calçado ortopédico. A seus pés alinhavam-se três ou quatro sacos de plástico cheios de compras. Ela encostava o telemóvel ao ouvido direito e falava, gesticulando com o braço esquerdo. O cabelo amarelado, comprido, baço e apanhado num rabo-de-cavalo, emoldurava a cara que apresentava mais sulcos do que terra lavrada, denunciando a idade adiantada e uma vida difícil. A farmácia estava praticamente vazia. Apenas uma cliente era atendida ao balcão. Eu passeava pela secção de cosméticos enquanto esperava que a minha colega levasse a vacina da gripe e ouvia toda a conversa da mulher que, indiferente ao local em que estava, falava alto contando a quem a ouvia do lado de lá do telemóvel as suas histórias de família. Falava do filho e da nora, do jantar do fim-de-semana, de zangas e de encontros inesperados. Falava alto e, de vez em quando, animada pelo curso da história que contava, soltava palavrões e impropérios. A mulher ocupava aquele banquinho da farmácia como se estivesse sentada no sofá da sua sala. E falava.

Ao fim de uns dez minutos, saí e ela lá ficou alimentando o seu assunto.

Eu fui pensando em que figuras um banal telemóvel nos pode colocar e em como a vida privada se pode escancarar numa qualquer rua, num qualquer café. Até numa farmácia.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O sonhador


É obra do filho de uma colega minha.

Partilho aqui este sonho desenhado, que me pareceu um verdadeiro poema visual.

Prémio Dardos - Adenda

O seu a seu dono.
Devo também agradecer à Isa GT, que ainda antes deste que afixei aí abaixo, já me tinha destinado um, no seu sempre animado espaço, Doce ou Travessura?

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Intensamente

A manhã está mais fria, confirmando as previsões meteorológicas ouvidas no noticiário radiofónico. O céu já tem a cor cinza do Inverno para que o dia acompanhe as tendências da estação. Mesmo assim, há uns raios de sol que tentam trespassar as nuvens mais carregadas. Na minha caminhada entre o estacionamento e o local de trabalho, piso as folhas caídas que iluminam a calçada com os seus tons de ouro. Na esplanada do café o guarda-sol vermelho está aberto e ostenta a assinatura da marca buondi, que patrocina o espaço.

Intensamente.

Decido que é com essa palavra que vou decorar a minha semana. Vou grafitá-la nas paredes do meu pensamento para que, em cada dia, me recorde de a viver.

domingo, 7 de novembro de 2010

Prémio Dardos


Por estes dias tenho visto muitos dos belíssimos blogs que visito afixarem o Prémio Dardos, um reconhecimento de seus pares na blogosfera. Estava no entanto longe de pensar que me calharia receber um deles na minha humilde Esquina. Para mais, foi-me atribuído pelo Carlos Barbosa de Oliveira do Crónicas do Rochedo, a quem muito agradeço pela honrosa distinção.

Ao aceitá-lo, devo aqui explicar que:

“O Prémio Dardos é o reconhecimento dos ideais que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc.... que, em suma, demonstrem a sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre as suas letras e as suas palavras. Estes selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre blogueiros, uma forma de demonstrar o carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web.»


E devo ainda atribuí-lo a pelo menos dez outros blogs. E esta, para mim, é sem dúvida a parte mais difícil. Por um lado, muitos dos que eu gostaria de citar, já receberam estes Dardos. Por outro, sinto que vou sempre deixar alguém injustamente de fora desta minha escolha. Em todo o caso, não me vou agora acobardar e por isso, aqui vai, numa ordem perfeitamente aleatória:

O blogue que ninguém lê

Branco no Branco

Dias assim

Interioridades

Dias que voam

Garden of Philodemus

Ofício diário

Das palvras o espaço

Novo mundo

we'll always have Paris

Passeio de Domingo (23)


Daqueles em que não se vai longe. Só mesmo até aos canteiros das vizinhas.

sábado, 6 de novembro de 2010

A vida secreta dos objectos - A boneca pisa-papéis

Vida secreta? Mas qual vida secreta?
A minha vida sempre foi de uma total transparência. Mal me criaram e prenderam-me logo neste grosso e pesado vidro absolutamente transparente. Nunca tive escapatória. Toda a minha vida estive nesta montra, visível a qualquer olhar. Não há cá segredos. Sou uma boneca pisa-papéis e pronto. Sou algarvia e todos podem comprová-lo pelo meu alegre traje. Aliás sou uma boneca pisa-papéis feita para turista levar para casa e recordar as suas férias portuguesas. No meu caso, não foi bem um turista que me levou. Foi uma menina emigrante que sempre que vinha de férias à sua terra era presenteada pelo seu tio Zé com alguma lembrança local. Ainda me lembro de um companheiro de prateleira que tive: um burrito de corda sintética e entrançada que carregava nos seus alforges coloridos uma ou duas amêndoas e uma alfarroba. Não sei o que terá sido feito dele. Não o vejo há séculos. Nem sei se terá resistido à viagem de regresso ao país de origem, com a confusão toda da mudança de vida. E na minha vida não há cá segredos. Também, sem me poder mexer nesta prisão de vidro… o que é que eu poderia fazer?
Tenho que ficar para aqui, estática, e nos últimos anos até vivo sem grande utilidade. Já nem vivo na casa da menina. Ela cresceu e mudou-se para a casa ao lado. Não me levou com ela.
Acho que de tão transparente que é a minha vida, até me tornei invisível. Hoje em dia já ninguém me vê. Fico parada, pousada sobre a arca de madeira do pai da menina que entretanto envelheceu. Nem para pisa-papéis já sirvo.
Às vezes sonho que a minha prisão de vidro se parte e que consigo fugir daqui. Sei lá… apesar da idade ainda me sinto leve e, por uma vez ao menos na minha vida, gostava de dançar um corridinho.



Publicado também para a Fábrica de Letras que, em Novembro, propõe o tema transparência.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Verde viço



Sobre negras folhas mortas que a chuva dos dias apodrece, renasce, porém, o verde viço da vida.





quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Mãe

Há dez anos, hoje era sexta-feira. E era, como hoje, um dia límpido. O telefone tocou logo pela manhã. Do hospital chamavam-me porque “tinhas piorado”. Soube, quando lá cheguei, que “piorado” era apenas um eufemismo. Tinhas passado. Sim, tinhas passado para o outro lado da vida. E nem te despediste. Não estava previsto, pois não? Era para regressares a casa, era para melhorares.
Há dez anos, o sol tal como hoje brilhava e trocaste-nos as voltas. Partiste.
Há dez anos, foi esta manhã.

Leituras

Internet vs livros... isto já me deu que pensar.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Azul turquesa

São como flashes. De repente, certas imagens abrem-se como janelas na memória. Então vejo-me nitidamente como numa cena de TV. Vejo-me percorrer o caminho para a escola. Era uma vereda, entre velhos valados de pedra cinzenta. Tão cinzenta como a cor desse dia de vendaval. A chuva e o vento empurravam-me caminho adiante. Eu, frágil criatura de sete anos, meio amedrontada naquele ermo percurso, enfrentava o vento que retorcia as árvores. Gigantes troncos negros de densa e escura folhagem, as alfarrobeiras estendiam para mim os seus galhos retorcidos. Eu apressava o passo sem dificuldade, ajudada pela força da ventania. A chuva caía, cinzenta também. Eu fazia aquele caminho, sozinha, porque então, aos sete anos não era preciso a companhia da mãe. Não era levada para a escola pela mão. Já era suficientemente crescida. E no temporal, lá ia eu. O dia era baço. E na cena que se abre, nesta pequena janela das lembranças, apenas vibra a cor da minha capa. O meu impermeável, uma espécie de encerado que me protegia das bátegas, era azul.

Era azul-turquesa.