segunda-feira, 29 de julho de 2019

In Memoriam


Partiu hoje uma das pessoas bonitas que, por causa dos blogs, tive o gosto de conhecer pessoalmente.
Era um jardineiro de amizades, que tratava com mestria.

Até um dia Rui.

segunda-feira, 22 de julho de 2019

Motard


Junto às escadas rolantes que me preparo para descer, não sou atropelada por pouco. A mota azul não faz muito bem a curva e para mesmo junto a mim em obediência à voz da avó do condutor que lhe ordena que ponha o pé no chão. Com a mão sobre o ombro do motociclista, redireciona-lhe a trajetória enquanto me olha elevando as sobrancelhas e abanando levemente a cabeça numa mensagem de paciente desespero. Sorrio-lhe, compreensiva. Não é fácil ser copiloto de um condutor indisciplinado.

sábado, 20 de julho de 2019

A água está fria


A água tem estado fria. As queixas vão se fazendo, especialmente à segunda-feira, no regresso ao trabalho, quando as colegas resumem o fim de semana ou as férias que terminaram. “Resumem” é talvez um termo pouco adequado para o tamanho das conversas que até se costumam esticar.

A água tem estado fria. Também a prima que veio de Paris se queixa, ela que agora instalou um spa e se banha em águas de temperatura controlada. Queixa-se, mas depressa se ambienta e cumpre a sua tradição pessoal de multiplicar mergulhos e braçadas para regressar carregadinha de energia à cidade luz.

A água tem estado fria. Comprovei-o eu também esta manhã. Assim que a primeira onda me lambeu os pés, senti um leve arrepio. Apressei a entrada do resto do corpo contando com a ajuda do sol escaldante e da cor sedutora do mar. A água estava fria, mas, envolvida na sua transparência quase excessiva, nadei e deixei-me embalar pelas pequenas vagas que rebentavam desencontradas, sublinhando o momento com traços de espuma.

sábado, 13 de julho de 2019

Si tu t'imagines

Suspeita


No supermercado, chego-me à caixa e coloco os artigos no tapete. Retiro dois sacos de compras da mochila, abro-os e arrumo-os no carrinho para ir guardando os volumes à medida que são registados. Antes de começar, a menina faz-me sinal para lhe mostrar os sacos. Por segundos acho que quer verificar se são novos para cobrar o respetivo preço, mas logo se eleva da cadeira ao mesmo tempo que levanta os sacos e espreita para dentro do carrinho para ver se não está lá nenhum item “esquecido”. Sossega ao ver o fundo do carro vazio e inicia o seu trabalho. Chegado o momento de pesar as maçãs, olha indecisa para a fruta. Digo-lhe que são gala. E ela: não são jonagold?. E eu: são royal gala. Volta-se então para a colega da caixa ao lado para confirmar. A colega da caixa ao lado também hesita. Eu repito que são gala. Com ar contrariado e pouco convencida pesa as maçãs e continua a tarefa.

Já me olhei várias vezes ao espelho desde que cheguei a casa com as compras de supermercado. Eu não noto nada de diferente, mas, por qualquer razão misteriosa, esta tarde devo ter ficado com cara de bandida.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Estendal


Para variar estive hoje estendendo roupa. Já o sol se tinha posto, mas sobrava luz do dia. A lua, um pouco mais de meia, piscava-me o olho lá de cima. Entre uma mola e outra, do alguidar à parte livre da corda, fiquei espantada a olhar as “cores irrecuperáveis do céu”. *

*expressão roubada a Borges (Tlön, Uqbar, Orbis Tertius).


Telemóvel


Hoje, esqueci-me do telemóvel em casa. Passei bem o dia.

segunda-feira, 8 de julho de 2019

À mesa


Anos atrás, com os filhos pequenos, ir ao restaurante podia não ser uma experiência muito sossegada. Não é fácil manter crianças sentadas à mesa durante uma refeição mais longa e o serviço sempre demora um pouco. Reconheço, não terei sido a melhor educadora. Deixava-os sair da mesa e dar as suas voltinhas à volta da dita, a bem da paz familiar e social. Anos atrás não havia telefones inteligentes com ecrãs de toque, instrumentos que hoje se generalizaram e não faltam em restaurantes nas mãos de miúdos e graúdos. Mal se instalam as famílias à mesa, já os graúdos colocam os aparelhos no lugar do prato dos miúdos, ligam vídeos e jogos e asseguram que o repasto não será interrompido por qualquer birra ou inquietação. Ainda há pouco, mesmo ao meu lado, o rapazito, que andaria nos seus cinco anos, segurava o telemóvel à altura dos olhos, que dele não desgrudavam, cotovelos fincados na mesa, ladeando o prato de comida. A mãe lá o ia alimentando às colheradas, que fazia passar diligentemente por baixo do telemóvel, também ela zelando pela paz familiar e social.

domingo, 7 de julho de 2019

Passeio de domingo (453)


O vento excessivo da tarde desaconselha-me o passeio. A manhã gastei-a na praia, sim, mas sentada na companhia de U. Eco e da minha filha que, por seu lado, se entreteve com I. Calvino. Resultado: chega aqui um passeio que já tem algumas semanas, mas que pode bem passar por ser de hoje. Basta que "suspendamos a incredulidade".











quarta-feira, 3 de julho de 2019