Chego a casa com o suor no rosto e trago entranhados em mim os cheiros de cada passo de mais um caminho nocturno.
O vento fustigou-me com o ar quente que sobrou do dia e colou-me ao corpo os odores de comida que se escapavam desta e daquela casa: um jantar de grão, uma carne frita, um bolo de forno.
Agarrado a mim veio também o perfume forte da trombeteira, essa flor do diabo que no início do Caminho do Furadouro sempre resolve tomar-me de assalto. Subindo a Rua da Escola, a brisa morna trouxe-me o cheiro do gado, depois do pastor já ter recolhido o seu pequeno rebanho. E a roupa lavada que ficou a secar naquele estendal também me apanhou, deixando impregnado nos meus cabelos o seu cheiro fresco que até agora não me largou.
Para lá dos cheiros, trago ainda as vozes dos que pelo caminho se cruzaram comigo. Repetidos “Boa noite!”, daqueles que por aqui ainda se dizem, mesmo não conhecendo o seu destinatário.
Os caminhantes subitamente aumentaram trazidos para a rua no frenesim do bom tempo. Encosta acima, encosta abaixo: “Então vizinho?..Já vai de volta?”
E mais um “Boa noite” atirado pelos três velhotes que hoje começaram a trocar a televisão da sala, pelo poial de casa, junto à porta de entrada, e apanham a fresca trocando histórias. Por fim despedem-se: “Então, até outro dia …se Deus quiser”.