O meu mundo é feito de janelas. À
vez, escolho-as para me debruçar nos seus parapeitos. Tenho a de caixilhos de
madeira que abre sobre o pátio da frente, a estrada e a horta. Também abre
sobre uma boa porção de céu. Por estes dias é a que mais abro, ora para sentir
o ar molhado da chuva, ora para me aquecer na maciez dos raios de sol. Por ela,
observo ainda a azáfama dos pássaros que voam dos galhos das árvores para os
fios do telefone, do poste da luz para a cerca do vizinho, do cimo do cipreste
para a antena da televisão.
Depois tenho um sem fim de janelas
com caixilhos de bits e de bytes de onde observo boa parte do resto do mundo. Nestas
há sempre uma parte do vidro que não abre totalmente. Está ali como um filtro
de luz que me orienta o olhar, queira eu ou não olhar exatamente para ali. E
depois há também o meu próprio filtro, incorporado nas minhas janelas de
partida, as que têm caixilhos de pele e pelo. Nenhuma das outras se abre sem
estas, claro.
Mas as que agora me estão a
trazer os dedos para as teclas são umas janelas que eu costumo abrir com
regularidade diária para respirar perfumes de outras vidas. São perfumes
compósitos, muitos deles enganadores, criados por mestres da ilusão. Por isso,
quando abro essas janelas, sei que devo ter o máximo cuidado no uso das minhas
faculdades de perceção, não vá eu ser guiada pelo mais cego engano. Esses
especiais cuidados têm o poder de me aumentar notoriamente a acuidade visual, com
imediatos reflexos nos restantes sentidos. Assim, consigo daqui descortinar
perfeitamente uma série de janelas, abertas umas sobre as outras, com gente
debruçada sobre este domingo morno, aspergindo o ar com aromas de sedução.
Muito poético, Luisa. Gostaria de, neste momento, ter a oportunidade de abrir uma janela assim – como a do primeiro parágrafo – e ter essa paisagem tão “belamente” desenhada. Assim, em frente a este computador, tenho uma janela à minha esquerda. Olho lá para fora e vejo um esquilo – talvez o esquilo de sempre, quem sabe – a correr pela vedação do meu quintal; os arbustos não têm nem uma folha; pássaros, não os vejo. Os pinheiros estão de um verde embaciado; mais um dia cinzento.
ResponderEliminarContinuo a ouvir Michael Bublé no Youtube.
: )
Boa tarde Luisa,
ResponderEliminarUm texto muito belo.
Bjs
Ailime
Ao ler também descortinei por instantes as janelas e as pessoas debruçadas
ResponderEliminarGostei muito deste texto.
Na minha melhor "vista" vejo as copas das árvores os pássaros e por vezes as rolas além disso tenho uma sinfonia de sons por vezes ensurdecedora pois os pássaros cantam sem parar.
ResponderEliminarMoro numa rua sem movimento portanto é impossível não ouvir pássaros, grilos, rolas, gatos e cães que graças a Deus não se manifestam todos ao mesmo tempo :)))
Tenho imensa sorte pois vivo no campo mas a 3km da vila é um local muito simpático sem barulhos irritantes.
Bjs E espero que recuperes para recomeçares os teus passeios.
janelas abertas
ResponderEliminarde tão (in)discretas!
A maioria das janelas só se abre pela metade e por muito que espreitemos pouco ou nada vimos e outras, o que vimos é um pouco triste. Mas Luisa,há tanta janela que nos mostra tanta beleza, tantas palavras maravilhosas, que nos ensina tantas coisas :)
ResponderEliminarGostei pra lá de tanto de ter aberto as minhas janelas até aqui, é sempre um prazer matinal.
ResponderEliminarÉ que "espreitar" através das vidraças ... permite "prosar" com poesia! Bj
ResponderEliminarCatarina,
ResponderEliminarMas tu tens janelas com vistas tão bonitas, por aí! Nuca vi um esquilo ao vivo e bem que gostava. :)
Ailime,
Obrigada pelo apreço.
Gabi,
Fico contente que tenhas visto. Obrigada. :)
Papoila,
É bom mesmo viver no campo, sobretudo quando a cidade não está longe. :)
Manuel Veiga,
Umas mais que outras. :)
GM,
Janelas, como pessoas. Algumas são muito bonitas, mesmo. :)
Manel MT,
E o que eu gosto de espreitar pelas tuas… :)
Gracinha,
Embora por vezes a prosa possa sair um tanto embaciada. :)
adoro debruçar-me da minha janela para ver a tua :)
ResponderEliminarLaura,
ResponderEliminarE eu digo-te vice-versa. :)
As tuas «trivialidades» estão cada vez mais sérias e interessantes...
ResponderEliminarParabéns,, Luisa.
Beijo ~~~~~~
tantas sinestesias no teu texto e nas tuas janelas. Os simples pensam que janelas servem só para olhar, mas os que gostam de ver a profundidade das coisas banais sabem que janelas trazem visões mas também cheiros, memórias, sons e texturas.
ResponderEliminarUm belíssimo texto... para apreciar com calma... como uma boa fragância...
ResponderEliminarPara ler e reler!...
Beijinhos
Ana