Nunca usava. Até que, depois de muito adiar, decidiu que desta
vez o faria e lá comprou uma máscara. Aplicou-a e concluiu que afinal até
gostava do seu efeito nas pestanas.
terça-feira, 28 de fevereiro de 2017
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017
domingo, 26 de fevereiro de 2017
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017
quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017
Entre terra e céu
Um céu embaciado esfarela-se em pó de deserto, derrama-se
ruivo sobre o branco dos muros, sufoca as folhas das plantas no canteiro.
Do lado de dentro da janela, espero por uma chuva redentora,
uma chuva que leve consigo o barro de volta às entranhas da terra. Não sei se
virá.
Também não sei se virás. Espero-te como à chuva. A ti e às
palavras que poderiam levar-me de volta ao céu.
terça-feira, 21 de fevereiro de 2017
segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017
Apito
Piiiip. Como um apito. É um só e
isolado apito que, por isso mesmo, nunca conseguirei gravar. Nunca é esperado. Não
tem repetição imediata mas não há quase dia nenhum que o não ouça. Estou
sentada no muro baixo do pátio, antebraços descobertos, a trabalhar com o sol
na minha síntese diária de vitamina D e, de repente, piiiip. Dois segundos, não
mais. Nada vejo, nem um voo de pássaro. E eu acho que é um pássaro que assim
pia. Mas como sabê-lo? Como comprová-lo? Já vasculhei o Google de piiip a
piiip, que é como quem diz de ponta a ponta, já corri as vocalizações de aves
disponíveis em site da especialidade e nada. Formulo uma e outra vez a pergunta
no campo de pesquisa, mas nada. Nada corresponde. Em tempos, cheguei a pensar
que seria um alarme. Mas que alarme apita por dois segundos e se cala de
imediato? Coloquei já essa hipótese de parte. É uma ave, acredito. Uma qualquer
ave desconhecida que resolveu piar assim só para me baralhar e me fazer
escrever este post, correndo eu o risco de passar por alucinada.
domingo, 19 de fevereiro de 2017
Passeio de domingo (345)
Continuo em modo flashback e, por isso, trago vistas de Cacela Velha, restos de uma passeio ao sotavento algarvio, em setembro 2016.
sábado, 18 de fevereiro de 2017
Luz
Quando, em dias como hoje, não há luz que me valha, fico
muito sossegada esperando que aciones o interruptor.
quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017
Voo
Quando se
cansava do pó dos caminhos, abria as asas, tomava impulso desde um qualquer fio elétrico e voava até se impregnar totalmente de azul e se confundir com o céu.
No cabo, ficavam os sapatos, irremediavelmente esquecidos.
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017
Gaivotas
De manhã,
quando abri as janelas da sala, atravessavam o céu umas dez ou doze gaivotas. Passavam alto e tive de olhar atentamente para
perceber que eram mesmo gaivotas. Bem sei que em voo de pássaro a distância
encurta mas o mar ainda está a alguns quilómetros e não é assim tão frequente
elas se aventurarem até aqui. Fiquei parada a vê-las planar. Foi certamente o vento
que as trouxe. Tão forte tem soprado, o vento. Tão forte, o dia todo. Trouxe-me
gaivotas pela manhã e eu esperava que me trouxesse as palavras certas pela tarde.
Enganei-me. O que ele fez foi levar as gaivotas de volta para o mar e percebo agora
que no seu dorso voaram também as palavras.
terça-feira, 14 de fevereiro de 2017
A porta ao lado
Hoje, aconselho que batam a esta porta.
segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017
domingo, 12 de fevereiro de 2017
sábado, 11 de fevereiro de 2017
Chuva
Hoje não saberei senão falar-te da chuva oblíqua que se atravessa
na frente dos meus olhos, do lado de fora da vidraça. Cai oblíqua, ora mansa,
ora bravia e desliza sobre as superfícies que lhe cruzam o percurso. Um dia
inteiro sem mudar de direção. Descansa, só por momentos, deixando então que se ouça
o lamento das goteiras e os gritos das poças de água que os carros rasgam no
asfalto. Nem rumor dos pássaros. Cá dentro há o ronronar do forno e o aroma
doce do bolo de maçã que em breve estará no ponto.
quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017
Pauta
Procurei uma música. Nenhuma me pareceu adequada. Finalmente,
encontrei uma pauta e pensei que talvez possas ser tu a escrever a partitura.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017
Crepúsculo
Neste preciso instante não há rumor de vento lá fora. As
folhas das árvores escurecem à míngua do sol que já só se ocupa a tingir o céu
de rosa e laranja. O dia morre. É uma morte bela porque traz consigo uma
promessa de ressurreição. Amanhã é um novo dia.
terça-feira, 7 de fevereiro de 2017
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017
Sol
Sentei-me por uns minutos num pequeno muro baixo que tenho
aqui na rua. Arregacei as mangas para apanhar o sol. Apanhei-o com os braços e
com o rosto também, enquanto um vento leve passava os dedos pelos meus cabelos.
O cenário apresentava-se cheio de cor, especialmente de azul,
daquele azul dos dias límpidos, que nos entra poros dentro e nos ilumina o
olhar. O som estava a ser assegurado pelas aves que percorriam o ar entre o
cipreste que está junto ao portão e as árvores da horta. Outras tantas, nas
minhas costas, escondidas nos altos ramos das alfarrobeiras, conferiam ainda maior
relevo sonoro ao ambiente, como que em estereofonia. Uma borboleta branca volteou para cá e para lá
sobre a minha cabeça. Uma joaninha pousou no chão, do lado de lá do meu pequeno
muro. Em voo rasante passou, repentinamente, uma andorinha. E logo outra. Chegaram já. Sorrio.
Pode bem chover amanhã, e nos demais dias da semana,
conforme vi que se prevê no sítio da meteorologia. Pode. Porque vou guardar em
mim, como reserva, aqueles minutos em que apanhei o sol.
domingo, 5 de fevereiro de 2017
sábado, 4 de fevereiro de 2017
Tangerina
Descasco uma tangerina. A sua casca
rasga-se num frémito e suspira entre os meus dedos. Por instantes, dançam no ar
pequenas gotas de um gás incendiário que me vem depois morrer na pele. Separo os gomos e mordo-os um a um. Lavo as mãos mas o seu cheiro não sai.
Parece-me ouvir uma voz que me diz partilha. Partilha. Então, escrevo-o aqui na
tentativa de o fazer passar pelo texto para outra pele.
sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017
Uma flor
Se eu pudesse, ia agora mesmo procurar uma flor de
amendoeira. Escolheria a mais desabrochada, uma que já tivesse vivido dias de
chuva e de sol, uma que soubesse quase tudo da vida das flores de amendoeira,
como uma mulher sabe quase tudo da vida das mulheres. Então, haveria de a
colher com muito cuidado e logo a prenderia nos meus cabelos para que, como num
encantamento, me fundisse nela.
E eu aqui, algarvia, espremida entre a lentidão e o cumprimento
Neste texto sinto-me abraçada pela escritora. Ouso dizer que
sou uma mistura desta herança lenta de deuses adormecidos ao sol e de quem
costuma usar a chave do respeito pelos outros e cumprir. Cumprir o melhor
possível.
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017
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