segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Retalhos

Nos últimos dias, sempre que chegava a casa, deparava-se com a mesa da cozinha coberta de retalhos. Velhos retalhos de diversas cores e diferentes padrões cobriam o tampo já gasto da mesa de fórmica. Pedaços de tecido amarrotado, sobras de corte, tiras desfiadas.

Não percebia que fenómeno era aquele. Como é que chegavam à mesa da cozinha aqueles bocados de pano velho se não vivia ali mais ninguém?

Nos dias anteriores ainda os tinha despejado para dentro de um saco que depois tinha arrumado a um canto da arrecadação, mas naquele momento o cansaço prevaleceu. Olhou para a mesa da cozinha e para todos aqueles retalhos que pareciam querer lembrar-lhe alguma coisa e arrastou-se para o quarto. Deitou-se. Sentia fugir-lhe todas as suas forças. Percebeu que aquela era a sua última noite.

Fechou os olhos e, no clarão que nesse preciso momento o cegava, viu, ali na sua frente, esvoaçando, centenas de pequenos farrapos, retalhos de pano velho de cores e padrões diversos. Neles reconheceu finalmente todos os seus sonhos perdidos.

7 comentários:

  1. Querida Luisa, muito bom este texto! Gostei da metáfora.

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  2. Olá Luisa,

    Bem interessante....
    Gostei!!!

    Feliz Semana
    1000 Beijokinhas

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  3. Gostei muito...tenho muitos retalhos desses...
    Bonito texto

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  4. Se todos tivéssemos retalhos de panos velhos, à medida dos sonhos que perdemos ou esvoaçaram pela janela, não seria ele o único a vê-los despojados na mesa da cozinha... :)

    Beijocas!

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  5. Ai, Luísa... que história triste... e o pior é que é verdade. Todos temos um saco de retalhos encondido algures e, um dia, ele vai cair-nos à frente... Que triste dia, esse... Beijinho

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