Vejo-as, ainda de longe, no passeio do topo da rua pela qual
caminho. Observam, como que a medo, o corpo que repousa num banco público.
Trocam impressões, inquietas, seguram o queixo com uma mão, apoiam a outra na
anca, dão um passo em frente, inclinam o tronco para aproximar os olhos do
objeto da sua curiosidade, recuam um passo e voltam ao seu posto inicial de
observação.
Um homem acerca-se das duas mulheres. Imagino-lhes os
questionamentos sobre quem se mantém ali estendido, imóvel, corpo morto sobre o
banco, debaixo de uma árvore de escassa folhagem. Num repente o homem chega-se
ao corpo inanimado e, como aferindo-lhe a pulsação, pousa os dedos sobre o
pescoço da criatura que, apenas adormecida, se senta de sobressalto.
Gesticulam e explicam-se os três observadores dando conta
das suas inquietações à mulher já acordada e a refazer-se do susto. A conversa
está agora ao alcance dos meus ouvidos. Aconselham-na a colocar a cabeça à
sombra, que se deite, sim, mas que se proteja do sol.
Enquanto a mulher ensonada se mantém muito direita, sentada
imóvel no banco de jardim, as duas primeiras vão à sua vida, dizendo uma para a
outra, que não se podia ir embora sem fazer nada. Não podia. É que não iria
ficar de bem com a sua consciência.
Ah, quanta tranquilidade para se poder adormecer assim num banco de jardim, eu seria incapaz...e que bela descrição fez do quadro.
ResponderEliminar~CC~
Excelente a forma como descreves o acontecimento!
ResponderEliminarNa verdade não se pode ser indiferente a certas situações.
Beijinho Luísa
Se há algo de que não podemos escapar e nem podemos enganar é a nossa própria consciência, podemos até tentar iludi-la ou iludir-mo-nos com relação à mesma, mas a própria e/ou as suas consequências são incontornáveis!
ResponderEliminarAbraço
A consciência, para quem a tem, pode ser uma coisa terrível.
ResponderEliminarNão são todas as pessoas que estão dispostas a parar para se inteirarem do que se passa. Cabe realmente ao livre arbítrio de cada um.
ResponderEliminarUma boa soneca interrompida, para uma, a consciência aliviada, para outras duas e uma situação do quotidiano belíssimamente contada !
ResponderEliminarGosto muito dos teus mini contos, Luisa ! ... Nunca pensaste escrever um livro ?... e uma recolha dos teus contos ?... Mereciam uma "rubrica" própria !
Beijinhos, amiga ! :)
CC,
ResponderEliminarEu também acho que não seria capaz, mas nunca sabemos em absoluto o que nos pode suceder. :)
Adélia,
No entanto, o mais provável era eu passar pela mulher deitada no banco e não me questionar sobre o seu sono. Seguiria o meu caminho com a minha consciência talvez mais inconsciente do que a daquelas duas mulheres.
Victor,
A consciência pode ser bastante mutável…
Pedro,
E quando assim é, pesa…
Mz,
Lá está. Eu não pararia. Será isto aquela maleita da indiferença que se tem vindo a instalar na vida das cidades?
Rui,
Fico feliz com essas palavras mas não me parece que estes pequenos apontamentos da vida quotidiana, neste caso testemunhados, sejam assim tão merecedores… :)
Não sei se teria uma consciência assim, ainda bem que ainda há quem a tenha :)
ResponderEliminarCom esta descrição até me pareceu que estava lá também :)
ResponderEliminara senhora levou um susto, mas se estivesse a precisar de ajuda as senhoras com consciência poderiam tê-la salvo...
...claro, a mutável plasticidade da consciência é tanta que pode divergir numa mesma pessoa em momentos e contextos diversos, ainda que face a um mesmo equitativo assunto, para além de poder divergir muito entre indivíduos ou de entre o indivíduo e a própria consciência colectiva, etc.; pelo que o que eu quis dizer é que não podemos fugir à mesma quando, como e enquanto a mesma é nossa e/ou em nós mesmos, duma determinada forma, num determinado espaço e tempo. E no caso a consciência daquela senhora, naquele momento e naquela circunstancia levou-a a agir como agiu, sem prejuízo de numa outra oportunidade perante situação absolutamente semelhante a própria já não agir da mesma forma, por designado e simples hipotético exemplo não agindo de todo... vb
ResponderEliminar