Quem não sabe não nota. Mas eu sei que aquela pequena cicatriz está ali e vejo-a sempre que me olho ao espelho. Está ali no lado direito do lábio inferior. Está ali onde noto uma pequena saliência que ficou desde que cortei o lábio no canto da mesa de cabeceira. A bem dizer, já só a consigo ver quando estico a boca. Então percebo o leve traço esbranquiçado a marcar a diferença no carmim do lábio. Já tem uns 45 anos ou mais, esta cicatriz. Não consigo já situar o ano exato em que caí da cama e cortei o lábio no canto da mesa de cabeceira. Mas vejo com perfeição o quarto em que dormia quando isso aconteceu. Recordo nitidamente a posição da cama, de frente para a janela, e o colorido dos ladrilhos hidráulicos que atapetavam o quarto. Na verdade não me lembro da queda, nem da dor. Só me lembro de acordar de manhã com o sabor enjoativo do sangue na boca e o lábio inchado que assustou a minha mãe. Por isso me levou à vila, à farmácia. Fomos de camioneta. Na verdade não me lembro da viagem de ida. Só da viagem de volta. E de como vinha enjoada na camioneta. E de como fiquei aliviada quando chegou a nossa paragem e desci pela mão da minha mãe e caminhámos até casa sob o sol alto do meio-dia. Lembro-me que vestia um casaquinho de malha amarelo claro. Era um casaquinho de malha tricotado pela minha mãe e tenho a certeza que ela chamava ao ponto daquela malha “beijinhos de amor”.
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
domingo, 29 de janeiro de 2012
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Serenata desenhada
Há uma serenata de amor que toca no asfalto da rua. Foi composta e interpretada numa destas noites. Não sei qual. Porventura foi numa destas noites de luar. Foi grafitada para a Andreia. A Andreia deve morar no prédio ali da frente. Imagino-a a abrir a janela pela manhã, a olhar para a rua e a ver-se espelhada no alcatrão. O seu nome como um grito. O amor a falar-lhe inglês como num filme.
Pergunto-me se a Andreia corresponde àquele amor ou se finge que não se chama Andreia … para disfarçar junto dos vizinhos.
domingo, 22 de janeiro de 2012
Passeio de domingo (81)
Passeio noturno pela minha aldeia e mais uma vez antecipado. Vem parar ao domingo por empréstimo e tradição já que mais uma vez estou em viagem de fim de semana.
quinta-feira, 19 de janeiro de 2012
O homem do sobretudo preto
Vai um homem caminhando pelo passeio esquerdo da rua. Vejo-o de costas, lá à frente, enquanto circulo vagarosamente ao ritmo da fila que arranca na passagem a verde do semáforo. O homem que caminha tem um ar distinto. Veste um sobretudo preto e transporta na mão uma pequena pasta de papéis. Tem o cabelo branco e caminha, elegante. No momento em que passo por ele vejo-o sacudir a cabeça ligeiramente para o lado direito. Acabou de cuspir para o chão e ainda consigo ver a trajetória dos seus eflúvios espumosos. Pelo retrovisor verifico que continua o seu caminho com o mesmo porte respeitável.
E eu juro que só tomei café com leite ao pequeno-almoço.
quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
Livros
... que pelos vistos também têm uma vida secreta.
....o que me faz pensar que tenho descurado os meus nestes últimos dias. Tenho pelo menos dois a suspirar por mim na mesa de cabeceira.
terça-feira, 17 de janeiro de 2012
A tia Bia
Saio pelas as oito da manhã. Está um dia claro, de sol radiante, mas que ainda não teve tempo de aquecer. Calcei as luvas porque a esta hora ainda me morde um rasto frio da noite que há pouco saiu de cena. Poucos metros rodados e passo junto ao portão da tia Bia para vê-la, já em ação, varrendo o quintal. Tem 86 anos. Ou será 87 já? O lenço que tem amarrado à cabeça protege-a da aragem e emoldura-lhe o rosto que testemunha uma longa vida de duro trabalho no campo. Varre o quintal e não tarda irá ali em baixo, junto à horta, para preparar uns farelos às galinhas. Não se descuida nunca nesta tarefa diária de alimentar a bicharada. Se eu não tivesse que trabalhar, estaria provavelmente ainda no aconchego do quarto ou tomando sossegadamente um café com torradas e assistindo aos primeiros noticiários do dia. Mas a tia Bia não se deixa levar por “molenguices”. De manhã começa o dia.
Sigo caminho pensando que quando for grande quero ter a disposição da tia Bia.
domingo, 15 de janeiro de 2012
Passeio de domingo (80)
Na capital, pelo Parque das Nações.
O passeio não é de hoje mas serve para dizer que estou por estas bandas e como vou chegar fora de horas a casa resolvi agendá-lo para aqui antecipadamente.
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
A vida é bela (2)
… quando imagino que alguém antes de mim parou e se encantou na mesma paisagem, ao ponto de se esquecer de um qualquer acessório.
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
Caminhando
Encostei a preguiça à parede e voltei a caminhar. Já é noite e o ar mais frio obriga-me a proteger as orelhas com uma espécie de auscultadores felpudos que me aquecem mas não dão música. O que ouço é o som surdo dos meus passos no asfalto. Ecoa-me nos ouvidos. Pum. Pum. Pum. Parece vir de dentro de mim. A cada passo ressoa. Ouço também os cães que em cada quintal de cada casa à beira do caminho vão ladrando, ladrando, ladrando… como que por contágio. Adivinho-lhes o porte pelo tom mais grave, mais agudo ou mais esganiçado e até há um que quase se engasga de rouquidão.
A lua vai cheia e reforça a iluminação do percurso. Ali, naquela curva há uma amendoeira já carregada de flores e a sua delicada alvura recorta-se como renda no fundo escuro da noite.
O treino
Já estou a treinar intensamente para estar em forma no
verão. Entre as 08h00 e as 8h45 circulo na Estrada Nacional 125, rumo a Faro.
Consigo praticamente todos os dias apanhar filas de trânsito, mas o melhor é
mesmo quando consigo, como hoje, estar numa fila que leva à frente uma
retroescavadora. Aí é que o treino resulta mesmo. Circulo à velocidade de
40km/h… vá … e 30km/h nas subidas… Do melhor que há para exercitar a paciência.
O verão e as férias vão ser uma papa.
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
A palavra do ano
É sempre a mesma coisa. Nunca consigo arrancar o primeiro lugar. Mas do mal, o menos…a minha escolha chegou ao pódio na segunda posição. O que eu acho é que os portugueses tiveram mau gosto. Búúú… que palavra tão feia foram eleger …
domingo, 8 de janeiro de 2012
sábado, 7 de janeiro de 2012
Os lápis de cor
Já não me lembrava deles. É certo que nos últimos tempos me deparava com frequência com notícias sobre os lápis Viarco. Nos jornais e na televisão surgiam reportagens sobre a tradicional marca portuguesa. Muito na linha de promoção dos produtos portugueses que agora de segue. E bem.
A Viarco era por isso uma marca que andava aqui na minha cabeça. Mas o facto é que não me lembrava deles. Não me lembrava daqueles lápis de cor, pequeninos, embalados numa caixa de cartolina cinzenta com um desenho colorido num dos lados. Só quando, há dias, entrei na loja da Vida Portuguesa, em Lisboa, é que se me iluminou a memória. Eu tinha usado uma caixa de lápis igual àquelas que ali estavam. Igualzinha.
E foi como se me visse criança de novo. Ah…maravilhosa nostalgia!
Imagem retirada daqui
quinta-feira, 5 de janeiro de 2012
terça-feira, 3 de janeiro de 2012
A vida secreta dos objetos - o marcador de livros
Estão sempre a dizer-me que sou um tipo com sorte.
“Ah e tal … fartas-te de ler livros. Tens imensas histórias para te entreter. Ficas um sabichão. Tens acesso fácil à cultura. Tens um trabalho que é também lazer. Oh quem me dera…”
Nããããã…
Anda tudo equivocado. Não é nada disso. A minha vida, no fundo, é terrível. Acham que eu leio muito. Pois… até leio. Mas é uma leitura constantemente interrompida. Nunca tem sequência. Só me é dada a ler a página que fico a marcar para que o leitor, esse sim, prossiga, quando bem lhe aprouver, sem perder o fio à meada.
Eu, desgraçadamente fico sempre em suspenso, perco as melhores partes da história…. Sim porque aí o leitor não desgruda. Vai lendo… lendo… e eu para ali jogado sobre a mesa-de-cabeceira ou no sofá da sala. Ao fim de um tempo, terminado o capítulo, com o cansaço nos olhos… agarra-me e enfia-me precisamente junto ao início do capítulo seguinte. E lá estou eu de novo a tentar perceber como segue a história… Chego a ficar doido. Sim que isto dá cá uns nervos que nem imaginam. Uma verdadeira tortura. Só quando marco poesia é que ainda me safo. Sempre consigo fixar-me num texto e lê-lo do princípio ao fim. Nem todos, vá… Mas quase sempre…
De resto tenho que me contentar com pequenos excertos de prosa, apreciar a construção de uma frase, observar a beleza das palavras. Não tenho outro remédio senão viver dos pormenores já que o vasto mundo dos enredos me escapa.
domingo, 1 de janeiro de 2012
Passeio de domingo (78)
No primeiro dia do ano...que foi logo calhar ao domingo, tinha que voltar aos passeios, não é?
E assim, lá fui até à praia e arredores.
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