Na verdade, não costumo reparar
no homem do talho. Fixo-me nas peças de
carne expostas na vitrine, tento organizar mentalmente as refeições que pretendo
preparar, decido o que quero levar para casa. Por vezes, não é homem, mas sim mulher
do talho. Depende do talho onde vou, claro. E tanto vou ao talho das grandes
superfícies, como ao talho do bairro onde mora a minha filha, por exemplo. Pode
ser no Algarve ou pode ser em Lisboa. E para além disso, raramente há lá só um
homem do talho.
Em todo o caso, o homem do talho
há de ser, para mim, parecido com o pai de uma amiga que tive na infância.
Aqui, também para falar verdade, não posso dizer que me lembre nitidamente do
pai da Brigitte. Mas na minha ideia surge-me um senhor de meia idade, um pouco atarracado,
com barba rija, de mãos grossas e pelo nos braços. Esta imagem, estou eu agora a pensá-la. Fui buscá-la
lá nos fundos da memória para fazer o contraponto ao homem do talho de hoje.
A decisão sobre o que levar
estava tomada antes de sair de casa. Assim, não precisando de me concentrar
sobre o conteúdo do expositor das carnes, enquanto esperava pela vez, o meu
olhar fixou-se no cabelo louro oxigenado do talhante e nos seus trejeitos
efeminados. Um homem do talho com o cabelo louro oxigenado, deixando ver por
baixo o tom escuro natural do dito, não combina. Isto é, não combina com o meu
preconceito. Fiquei a observá-lo,
divertida com esta nova imagem de açougueiro que se me apresentava. Enquanto me
atendeu, todo ele simpatia, brincou com a cliente seguinte, que devia ser
cliente habitual, e contou histórias de clientes bizarros, com obsessões por
carne, que vinham ao talho mais do que uma vez por dia e que ele, desentendido,
atendia como se ainda não os tivesse visto.
Com o meu frango do campo
devidamente cortado e embalado, despedi-me sorridente e satisfeita, como quem
descobre um novo mundo. Segui para a caixa do supermercado pensando que até um
talho pode ser um lugar estranho.
Julgo que gostaria de um homem do talho assim sui generis. Mas os do super que frequento são normalíssimos, o que também não é desagradável..
ResponderEliminaràs vezes imagino as pessoas por detrás das letras :) tenho a certeza que nã são nada parecidas
ResponderEliminarNão compro carnes, mas numa das grandes superfícies aqui junto a minha casa reparo num talhante por volta dos 30 anos, cabeça rapada e os braços não se vêm porque estão completamente cobertos com tatuagens, não sou contra, até porque adoro tatuagens, mas não exageradas. Pelo que me apercebo e parece ser muito atencioso e simpático para com os clientes.
ResponderEliminarBom domingo Luísa
Um lugar estranho ou divertido.
ResponderEliminar; )
Prefiro a versão da Catarina. A avaliar pela tua descrição esse talho inspira momentos bem interessantes...E não! Não sou preconceituosa.
ResponderEliminarEmbora os trejeitos efeminados, num homem, deixem muito a desejar. :)
Parece que iniciaste o ano em bom, Luísa.
Belos escritos estes teus...faz bem a um/a blogger mudar de ares. :)
Há dias fui atendida por um sr de rabo de cavalo, 50 pirciengs e 500 tatuagens lol era uma barbearia, onde também fazem tatuagens. A diferença, talvez esteja no sitio de onde estavas, um talho, de resto não faria confusão, ou faria? Desculpa a pergunta, mas quando falas em "trajeitos efeminados" e onde dizes "não combina com o meu preconceito" tavas a referir a uma possivel homossexualidade do sr?
ResponderEliminarBom Domingo.
Eu quase imagino os talhantes com os cozinheiros, "gordos", kkkkkkkkk.
ResponderEliminarGostei do texto. Bom dia
Bjos
Bom Domingo
Bea,
ResponderEliminarE eu gostei, sim. Como de uma lufada de ar fresco. :)
Manel MT,
É tudo uma questão de filtros. :)
Adélia,
O que interessa é o saber do ofício e a simpatia no atendimento. A coloração do cabelo e as tatuagens, são meros adereços.
Bom domingo para ti também.
Catarina,
As duas coisas, acho. :)
Janita,
Embora rejeitando o preconceito, há sempre situações em que ele nos assalta. Quanto aos ares do novo ano, hoje vão ensolarados e frios, muito frios. :)
Mena Almeida,
Quando ao preconceito, apenas se refere a uma ideia (nem positiva, nem negativa) que na minha mente descrevia um talhante. Era uma ideia sem fundamento, apenas ligada a uma vaga memória. Os trejeitos efeminados não significam grande coisa em relação à orientação sexual. Conheço homens efeminados que não são homossexuais e homens que são gays sem qualquer ar minimamente feminino. Nem uma, nem outra coisa afetam a minha empatia por quem quer que seja.
Um bom domingo para ti também.
Larissa,
Cada um com os seus próprios preconceitos. :)
Bom domingo para si também.
Olá Luisa, enquanto se espera na fila, seja ela de um talho, sempre podemos exercitar a nossa análise do mundo que nos rodeia, seja ele oxigenado, calvo ou com muita vegetação :)))
ResponderEliminarbom domingo
Angela
Maravilhoso texto :-))
ResponderEliminarBeijinhos e um excelente Domingo.
Ora aí estar!!! Também nunca me fixei na pessoa e "se calhar" devia!!!
ResponderEliminarbj
Elogiando o excelente texto, como outra coisa não seria expectável, da minha parte resta-me acrescentar que talvez, apenas talvez a própria vida e/ou a nossa própria humanidade seja um "lugar estranho" por si só, cujo talho é mero sucedâneo!
ResponderEliminarCumprimentos, em nome do melhor "lugar estranho" possível :)
Ângela,
ResponderEliminarÉ mesmo, as filas de espera são sempre boas oportunidades de observação das pessoas e seus comportamentos. :)
Cidália,
Muito obrigada pelo seu apreço.
Gracinha,
Há sempre um dia em que reparamos em alguém ou alguma coisa peculiar. Por vezes isso dá uma pequena história.
Victor,
Há muitos lugares estranhos na vida. De facto. Obrigada!
Bonito texto. Gosto como a Luísa observa o quotidiano e elabora uma pequena história, que não chega bem a ser uma história, mas que apanha bem um comportamento social novo, um aspecto da humanidade.
ResponderEliminarA imagem que também tenho de um talhante, corresponde sempre à de um homenzarrão, de braços fortes e peludos, mas hoje os tempos são outros, mais liberais e até os talhantes já são loiros oxigenados e felizmente, que vivemos dias mais coloridos, ainda que à conta da camomila ou da água oxigenada.
Um abraço
LuisY,
ResponderEliminarAinda bem, sim, que há hoje essa diversidade e que ela nos permite repensar a vida. O protagonista desta história é bem mais simpático do que a ideia feita que eu tinha de um talhante.
Obrigada pelo seu apreço. :)