sábado, 13 de fevereiro de 2010

Velhice relativa

Ser velho é relativo. Além do mais, tenho para mim que o que envelhece é mesmo a carapaça que acolhe o nosso espírito. Até o cérebro que comanda o nosso pensamento deve ter um recanto qualquer que se contraria a si próprio. Senão vejamos. Quando somos miúdos e olhamos para os nossos pais eles parecem-nos velhos. Mas quando chegamos à idade que os nossos pais tinham quando nós éramos miúdos, sabemos que somos ainda fantasticamente jovens. E enquanto ainda somos fantasticamente jovens e ouvimos os nossos pais, esses sim – pensamos nós – já velhos, falar entre eles daquela “moça” ou daquele “moço” e percebemos que falam da sua própria geração, sorrimos. Sim, sorrimos, até que chegados à idade dos nossos pais quando nós éramos fantasticamente jovens, damos por nós a falar com os amigos dos “moços” e “moças” da nossa idade. O nosso espírito tem uma grande dificuldade em acompanhar a idade do nosso corpo. Esporadicamente damos por ela. Quando, por exemplo, nos chega uma estagiária ao serviço, para orientar e que ela se vira para nós e diz: “Ah, a senhora é Fulana de Tal…foi colega da minha mãe na escola secundária…sabe… a Sicrana”. Ou então quando sentados, numa assembleia qualquer, olhamos para o lado oposto da sala e vemos alguém da nossa idade cujo rosto está fisicamente envelhecido, e ficamos surpreendidos com aquele lado do espelho. Se ele está assim…eu também devo estar. Mas logo se dilui essa surpresa. Sentimos que ainda há muito cabelo branco para nascer e que cada cabelo branco que nasce pode trazer um renovado sentido da vida.



il. Marcel Marlier

Publicado para Fábrica de Letras

4 comentários:

  1. Não podia estar mais de acordo com o que aqui se escreveu. Muitas vezes é nas rugas dos amigos, aqueles que não vimos há algum tempo, que reconhecemos as nossas, que percebemos que a nossa carcaça envelhece, apesar do nosso espírito se manter fantasticamente jovem.

    Excelente post! Beijinhos :)

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  2. É mesmo assim que a velhice chega sem nos darmos conta. Beijinhos

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  3. Muito bem, era a crónica que eu gostaria de ter escrito. Parabéns. A velhice não existe, é um estado de espírito... eu consegui ser velha aos 41!

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