domingo, 20 de junho de 2021

Desaparecimentos

 

Por muito que olhe para a estante, que passe o dedo pelas lombadas afastando os volumes uns dos outros, que abra as gavetas da secretária, que espreite para dento do armário, que enfie as mãos nos sacos e nas malas que tenho pendurados no cabide, que revolva o gavetão do armário da TV, que remexa nos papéis da primeira gaveta da cómoda, não há meio de encontrar o livro que li, não há muito tempo e que até anotei no caderno para contrariar os esquecimentos. Dei pela sua falta quando o quis arrumar no lugar que lhe caberia, à esquerda do segundo volume da história, entretanto terminado. Nada a fazer. Desapareceu de circulação. Poderia, talvez, amarrar uma fita à perna da cadeira com uns nós bem apertados, como manda a superstição, que diz que amarrando dessa forma os testículos do diabo a coisa perdida irá reaparecer. Mas, pobre diabo, que as sofre provavelmente sem razão. Também no ano passado me desapareceu uma corrente, daquelas que servem para pendurar os óculos e agora também se usam para segurar as máscaras quando precisamos de as retirar momentaneamente. Procurei-a por todo o lado, até nos mínimos recantos das minhas malas de mão, e nada. Conformei-me e arranjei outra corrente. Dias atrás, sem que tivesse percebido de onde surgiu, apareceu-me, caída no chão do quarto, sobre o tapete que semanalmente sacudo energicamente à varanda, a corrente perdida. O diabo não foi, acredito eu, pois não cheguei a atar qualquer fita que o obrigasse à devolução do objeto perdido. Talvez o tempo tenha um espírito misterioso, um fantasma brincalhão que, vai não vai, resolve moer-me o juízo, esconder-me objetos para mos devolver quando já me esqueci deles. Aguardarei, portanto, serenamente.

12 comentários:

  1. Ah, mas não pense que esses misteriosos desaparecimentos são um exclusivo seu, pois há muito mais quem se queixe do mesmo.
    Cá para mim, existe um Gasparzinho 👻 em todas as casas que adora divertir-se à nossa custa.

    Boa semana, Luísa!
    🐝

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    1. Aqui, comigo, já deve ser um Gasparzão, Maria. Acontece-me cada desaparecimento... :)
      Boa semana!

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  2. São os duendes malandros que vivem em nossas casas...até já escrevi um post sobre eles! Ora traquinas...ora queridos!😉

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    1. Lembro-me bem desses seus duendes, Dulce. Está visto que também me invadiram a casa. :))

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  3. Os desaparecimentos ainda são como o outro, Luísa, também comigo acontece o mesmo.
    O que está aqui a intrigar-me é o aparecimento!!
    Que estranho a corrente ir aparecer justamente em cima do tapete que sacodes com toda a energia, à varanda. Bom, talvez o tivesses metido no bolso do avental ou da bata que usas para fazer limpezas...e caiu lá sem que desses conta. :)

    Felizmente, tu, apareceste, o resto esquece! Não te esqueças é do caminho para o blogobairro. :-)

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    1. Avental ou bata, não uso para limpezas. É roupa velha mesmo... :) Pois não sei, Janita, o facto é que, como se diz, eu não acredito em bruxas mas que as há, há... :)))

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  4. o que desaparece e não é roubado, aparece mais cedo ou mais tarde.
    aconteceu-me muitas vezes, e acontece.
    se tenho a certeza de que foi em casa, sei que vai aparecer... e onde menos esperamos.



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    1. Espero bem que reapareça, Maria. Caso contrário fico com a coleção coxa. :)

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  5. Ora já estou nessa há muito tempo. Desde o inverno que aguardo uma saia de primavera desaparecida. Também tenho memória da Visão trazer num dos últimos números uma entrevista com Dulce Maria Cardoso; palavra que já penso ter sonhado, dei volta às revistas e a entrevista não aparece. E decerto tenho outros enigmáticos desaparecidos, mas como me esqueço deles não lhes posso dar pela falta. É viver com o que há e nos lembramos que existe. O resto acabará por surgir não se sabe onde.

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    1. Desaparecimentos e esquecimentos, eis uma valente dupla que me atanaza com frequência a vida. :))
      Boa noite, bea.

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  6. Ui, às vezes que essas coisas me acontecem:)
    Às vezes com final feliz, outras não. Deve depender dos diabos envolvidos :))))
    ~CC~

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  7. Espero que este, de que agora me queixo, seja compassivo. :)

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