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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

A vida secreta dos objetos - a vaca manteigueira


Eu devia ter desconfiado. Que ingénua fui. É bem sabido que estas terras do sul estão cheias de feitiços. O que por cá não falta são histórias de mouras encantadas e também são muitas as histórias de bruxas e de lobisomens. Como é que eu fui na cantiga da Luisa. Muito paz, muita serenidade: olha, vem mas é descansar um pouco, foge dessa guerra blogueira, passas cá uns dias, aproveitas o sol e até te divertes no Carnaval. Pois. E eu, burra, enfim, vaca desmiolada, caí na esparrela. Então não era de ter pensado logo que isto de ir de férias para um blogue com nome de esquina só me podia levar uma encruzilhada esquisita. E vejam só o que me aconteceu… Com a desculpa dos disfarces carnavalescos agora vejo-me transformada em manteigueira de cerâmica e não consigo libertar-me do trajo. Enquanto me mascarava, bem a ouvi murmurar umas palavras estranhas e agitar uns lenços de seda ao mesmo tempo que rodopiava em meu redor. No momento não entendi, apenas achei que ela, disfarçada de odalisca, ensaiava uma dança para o baile de máscaras. Mas ó, desgraça a minha, era o feitiço. Depois, riu-se muito, desembrulhou um pacote de manteiga e colocou-o dentro de mim. Agora és só minha, disse, ficas a pertencer à minha coleção. Não haverá quem quebre este feitiço, pois quem o podia fazer deixou há muito tempo as lides bloguísticas, continuou. E detalhando explicou: só a conjugação de uma lua cheia com o regresso de uma Pirata e da senhora Sorriso, poderia resgatar-te a esse corpo de barro. 


E agora, ai de mim…. Socorro! Muááááá, muáááááááa! 


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Objetos com expressão

Quem passa por aqui há mais tempo saberá que me divirto com as “vidas secretas dos objetos” atribuindo-lhes “intenções e emoções”. Por isso, não se admirará de eu ter ficado encantada ao ver aqui esta série de objetos que parecem mesmo ter expressão e vida própria e cujas imagens circulam na internet. 


terça-feira, 1 de outubro de 2013

A vida secreta dos objetos: o quadro das sardinhas

Meninas, atenção meninas… Ponham-se em ordem. Virem-se para a câmara fotográfica. Vá lá… não veem que ela só está à espera que se posicionem corretamente? Endireitem-se, sorriam, digam cheese!

Vocês as duas, aí no lado direito, parem de conversar e coloquem-se de uma vez por todas a jeito para a fotografia. Olhem que eu não quero ficar mal visto nessa tal de internet. Ah pois é! É que desde que uma certa Graça Sampaio publicou no seu picosderoseirabrava uma quantidade de sardinhas de Lisboa, ela não descansou enquanto não veio até cá acima para nos tirar o retrato e nos mostrar ao mundo.

Eu sei que essas tais ilustrações de sardinhas são muito apreciadas. E parece que a tal Graça até mostrou um fantástico vídeo das ditas. Ora bem, nós também viemos viver para Lisboa mas temos orgulho da nossa origem algarvia. É ou não é assim suas sardinhas marafadas? Tanto as meninas de crochet como as meninas de recorte nasceram de mãos do sul. 

Sou um quadro de sardinhas made in Algarve e também tenho o meu valor, ora essa!  É um valor sentimental, claro, mas não é isso que mais conta? O que seria da vida dos objetos se não fosse o sentimento. Só se safavam os objetos ricos. Eu, na minha simplicidade não deixo de fazer feliz a minha proprietária. Aqueles objetos muito caros, de nariz empinado, que se pavoneiam por aí não são mais do que eu. Ah pois não!


Vá meninas! Não se distraiam, sorriam e mostrem ao mundo como fazemos um conjunto jeitoso.


quarta-feira, 8 de maio de 2013

A vida secreta dos objetos: o frasco de álcool gel



A sério. Sabem há quantos anos estou para aqui encostado a outros frascos na prateleira do roupeiro? Pois. Há mais de dois anos.

Aquilo em 2009 foi uma loucura. À custa da pandemia prevista de gripe A, eu e os meus pares éramos os produtos mais procurados no mercado. Chegaram a verificar-se situações de autêntico desespero no interior das malas de mão das senhoras. É que era imprescindível que contivessem um pequeno frasco de álcool gel para usar em qualquer situação de necessidade de higienização das mãos.

Aquilo é que foi uma campanha a sério. Até esgotámos nas farmácias. Também é verdade que a produção aumentou porque, em seguida, passámos a estar disponíveis em qualquer supermercado.  Aqui em casa tenho a companhia de mais dois frascos. Um deles, verdade seja dita, está praticamente vazio. Eu ainda estou aqui para as curvas com metade da minha capacidade útil e outro ainda nem sequer foi encetado.  Mas qual quê? Para que servimos? Depois daquela febre toda, acabámos por sair da mala de mão, que se está sempre a queixar de peso excessivo, e arrumaram-nos na prateleira.

Hoje em dia, contentam-se em lavar as mãos com sabonete antibacteriano ou com aquele que estiver disponível enquanto nós, os frascos de álcool gel, entrámos completamente em desuso. Bem tentamos chamar a atenção quando ela vem buscar qualquer acessório aqui nas nossas redondezas, mas os tempos são de crise e não temos conseguido qualquer novo posto na mala de mão.

Isto assim não é vida. Estou seriamente a pensar tomar uma atitude mais enérgica. Tenho que convencer os meus pares a fazer lobby junto da OMS ou pelo menos da Direção Geral da Saúde para que promovam uma campanha capaz de nos criar novo emprego.

quinta-feira, 7 de março de 2013

A vida secreta dos objetos: o brinco desirmanado



Estou triste.

A vida é tão inconstante. De um momento para o outro tudo muda. Ainda ontem eu via dias de felicidade à minha frente e hoje estou inconsolável.

Depois de ter saído da montra da ourivesaria e de ter viajado numa caixinha forrada de algodão azul-bebé, estava convencido que ia finalmente ter uma vida interessante, que ia conhecer novas paisagens e novas pessoas. Sempre que ela me colocasse nas orelhas, a mim e ao meu irmão gémeo, eu ia poder passear pela cidade, ia ser admirado pelas suas colegas do escritório, ia divertir-me.

Mas vejam só… que pouca sorte a minha. No primeiro dia em que ela nos usou sucedeu logo uma desgraça. O meu irmão gémeo perdeu-se. Tanto ela como eu só demos conta do sucedido a seguir ao almoço. Estava ela a lavar as mãos quando se olhou ao espelho … e aí, também eu vi que estava sozinho no mundo.

Fiquei desesperado. Ela ainda procurou em vários sítios lá o escritório mas foi em vão. O meu parceiro deve ter caído na rua e sabe-se lá se não foi já esmagado por qualquer sapato descuidado ou, pior ainda, pela roda de algum carro.

Ai que tristeza. Agora estou condenado a passar os meus dias fechado numa gaveta e o mais certo é nunca mais ter uso.  

terça-feira, 11 de setembro de 2012

A vida secreta dos objetos - os velhos de pedra



Perguntas-me se eu não me canso de estar sempre aqui, sentado neste muro? Não. Um velho de pedra não se cansa nunca. Nada abala um velho de pedra. Nem o calor, nem o frio. Nem o vento, nem a chuva. Além disso não estou só. Tenho sempre a minha velha aqui ao lado. É facto que pouco conversamos. Velhos de pedra não conversam. Apenas estão. E nós apenas estamos aqui. Cumprimos a nossa função. Decoramos o muro desta casa, somos olhados por quem passa e também olhamos. Como agora te estou a ver com essa máquina fotográfica junto à face. 
Fotografa, fotografa. Somos giros, não somos? Diz lá que não temos muito mais graça do que dois leões, por exemplo? Ou duas águias, que também as há de pedra e em postos como este. Eu sei… temos muito mais pinta. Somos velhos e combinamos bem com o ambiente rústico e ao mesmo tempo poético de uma aldeia típica como esta. Fotografa, fotografa... assim levas um pouco de nós contigo. É impressão minha ou estás com inveja? Também querias ter uns velhos de pedra perto de ti, num qualquer muro da tua casa, não é?

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A vida secreta dos objetos - o Pai Natal de plástico



Senhores… é isso mesmo que estão a ver. Estou pendurado à parede deste prédio esquecido por quem aqui me colocou. O Natal já lá vai… ou, dependendo da perspetiva, ainda demora. E eu aqui a passar o verão com esta indumentária tão quente. Estou que nem posso. E o pior é que não vejo meio de sair daqui. Estou de tal maneira preso que nem o vento quando sopra mais forte me consegue arrancar. Ainda se eu conseguisse falar… gritava para os passantes e pedia ajuda.  Mas um Pai Natal de plástico não tem como se fazer ouvir.
Só eu sei como me sinto ridículo cá no alto. Muitas pessoas passam e nem me veem. Vão distraídas nos seus pensamentos, acorrentadas às suas preocupações e nem levantam a cabeça. Outras olham para mim e esboçam um sorriso. Gozam com a minha situação. Agora até há uma que resolveu fotografar-me. É de lado, é de frente… Soltar-me daqui é que está quieto…
Um Pai Natal, mesmo de plástico, tem mais o que fazer do que passar o ano inteiro especado na parede de um prédio. Será que não entendem isso. Até as crianças vão deixar de me dar crédito. Que graça tem verem-me aqui em permanência? O que será feito do entusiasmo das decorações natalícias quando chegar o seu devido tempo? Onde fica a surpresa? Ah… vida triste, esta!

terça-feira, 19 de junho de 2012

A vida secreta dos objetos: a agulha de coser empreita

Mas o que é que se estará a passar? Porque razão é que ela me veio retirar de dentro da caneca em que tenho estado acomodada nestes últimos anos? Tenho estado ali muito sossegada sobre o rebordo da chaminé a gozar o descanso da minha reforma. É um descanso merecido. Levei anos a fio a cozer braças de empreita para formar alcolfas, capachos, esteiras, ceiras, abanos, berços de bebé… eu sei lá... Trabalhei muito mas, com a partida da avó e depois da mãe dela, acabei por me reformar. É um direito. Se bem que pelo que consigo ouvir dos noticiários que passam ali numa caixa mágica cheia de pessoas lá dentro, parece que é um direito que cada vez está mais difícil de obter.

Eu cá não quero saber. Estou reformada e pronto. Não que eu me importe de voltar a produzir qualquer coisita. Mas vejamos: tudo tem termos. Não estou para ser explorada. Já contribuí muito para a economia local e para a sociedade. Não estou disposta a deixar que se abuse da minha boa vontade.

Mas afinal… o que é isto? Depois de me remover do meu retiro, lavou-me, esfregou-me, puxou-me o brilho… Ah … então e agora encostou-me aqui à bolsinha de empreita colorida para me fotografar. Já percebi. Vai-me mostrar ao mundo. Acho bem. E mereço que se dê a conhecer o meu trabalho.

E, parecendo que não, ainda sou uma agulha de cobre de jeito… nada de se deitar fora hein?

segunda-feira, 9 de abril de 2012

A vida secreta dos objetos: o frasco de iogurte

Estou tão contente! Eu que costumava estar encostado a um canto, bem no fundo da gaveta das tintas e que raramente era utilizado, ganhei uma vida nova. A bem da verdade, não gostava nem um pouco da serventia que me davam antes. Quando fiquei sem o iogurte de baunilha que guardava dentro de mim, passei a servir de recipiente para a água dos pincéis. Isso se alguém da casa lhe apetecesse armar-se em artista e começasse a esborratar os blocos de desenho. Então eu tinha que gramar com aquela misturada de tintas que logo me sujava todo. Era mesmo desagradável. De tal modo que quase preferia ficar esquecido no escuro da gaveta.

Agora não. Fui reciclado. É assim que se diz. Reciclar é o que está “in”. E eu, para ficar na moda, ganhei uma nova indumentária e aconchego dentro de mim um maço de palitos. Eu acho que fiquei bem catita. Dou-me bem com os palitos. São uns tipos simpáticos, asseados e bem falantes. Convivemos amigavelmente e estamos sempre a receber elogios.

A vida é assim. Não para de nos surpreender. Quando achamos que estamos acabados abrem-se novas oportunidades e conseguimos até rejuvenescer. Isto é mesmo verdade. Até para um simples frasco de iogurte como eu.


segunda-feira, 19 de março de 2012

A vida secreta dos objetos: o urso de peluche

Ai… ao que cheguei. Um urso vai para velho e logo fica para aqui esquecido num qualquer muro de canteiro. Já vai para duas noites que passo aqui ao relento. Bem sei que ainda tenho algum pelo que me protege um pouco das baixas temperaturas, mas isso não é tudo. Apesar de não chover, a noite sempre traz humidade. Mal escurece e começa logo a cair aquela leve cacimba que se me entranha no corpo. O que vale são os dias de sol. Ajudam-me a retomar a forma. De qualquer maneira, já estou a ficar aborrecido deste muro. Por muito que haja movimento ali na estrada – e estão quase sempre a passar automóveis e motorizadas e carrinhas de caixa aberta… - já nada me distrai. E depois, nem sequer olham para mim. Não me veem. E quem já nem tem olhos sou eu. Estou feito num farrapo velho. Um urso de peluche sem olhos. É para perceberem o trato que tenho levado, anos a fio, na mão das miúdas. Lembro-me de como era disputado por elas. Nessa época dispunha ainda de todas as faculdades de um verdadeiro urso de peluche. Era giro. Era macio. Elas gostavam de me apertar contra os seus corações. E eu ouvi-os bater. E ouvia os risos delas. E as cantigas. Ah… mas o melhor era mesmo quando chegava a hora de dormir. Eu tinha o meu lugar reservado no travesseiro. Uma ou outra abraçava-me e eu senti-me no paraíso. Os anos passaram e fui perdendo a minha beleza de outrora. De tal forma que há dois dias já que fui deixado aqui no muro. Abandonado. Completamente abandonado.


segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

A vida secreta dos objetos - a fotografia

Há pouco ela passou por aqui e olhou-me como se me tivesse visto pela primeira vez. Notei-lhe emoção no olhar. Estou aqui exposta nesta pequena moldura há já tanto tempo e só hoje é que ela me olha desta forma? Sempre que limpa o pó ela pega na moldura e passa-lhe com o pano. Nessas ocasiões ela também olha para mim. Mas entretida que está na sua tarefa, nunca parece ver-me. Hoje senti-a diferente. Olhou-me como se quisesse trocar de lugar comigo.

Fui tirada nos anos sessenta do século passado. Prepararam o cenário ajeitando os vasos de flores que enfeitavam o pátio da casa. Era uma casa com as paredes de escaiola. O sol a brilhar… a claridade ideal para fixar o momento. Colocaram-na junto aos vasos e dispararam. Foi assim. E é assim para sempre. Eu sou o preciso momento em que ela resmungava porque não queria tirar o retrato. Eu sou o momento eterno. E ela que passa por mim tantas e tantas vezes olha-me hoje de uma forma estranha. Como se quisesse extrair de mim o que já foi. Consigo compreendê-la. Percebo o fascínio que lhe causo. Mas não lhe posso devolver o que aprisionei em mim. Hei de sobreviver-lhe. Eu e o instante que sou.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Livros

... que pelos vistos também têm uma vida secreta.



....o que me faz pensar que tenho descurado os meus nestes últimos dias. Tenho pelo menos dois a suspirar por mim na mesa de cabeceira.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

A vida secreta dos objetos - o marcador de livros

Estão sempre a dizer-me que sou um tipo com sorte.

“Ah e tal … fartas-te de ler livros. Tens imensas histórias para te entreter. Ficas um sabichão. Tens acesso fácil à cultura. Tens um trabalho que é também lazer. Oh quem me dera…”

Nããããã…

Anda tudo equivocado. Não é nada disso. A minha vida, no fundo, é terrível. Acham que eu leio muito. Pois… até leio. Mas é uma leitura constantemente interrompida. Nunca tem sequência. Só me é dada a ler a página que fico a marcar para que o leitor, esse sim, prossiga, quando bem lhe aprouver, sem perder o fio à meada.

Eu, desgraçadamente fico sempre em suspenso, perco as melhores partes da história…. Sim porque aí o leitor não desgruda. Vai lendo… lendo… e eu para ali jogado sobre a mesa-de-cabeceira ou no sofá da sala. Ao fim de um tempo, terminado o capítulo, com o cansaço nos olhos… agarra-me e enfia-me precisamente junto ao início do capítulo seguinte. E lá estou eu de novo a tentar perceber como segue a história… Chego a ficar doido. Sim que isto dá cá uns nervos que nem imaginam. Uma verdadeira tortura. Só quando marco poesia é que ainda me safo. Sempre consigo fixar-me num texto e lê-lo do princípio ao fim. Nem todos, vá… Mas quase sempre…

De resto tenho que me contentar com pequenos excertos de prosa, apreciar a construção de uma frase, observar a beleza das palavras. Não tenho outro remédio senão viver dos pormenores já que o vasto mundo dos enredos me escapa.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

A vida secreta dos objetos: o blogue da esquina




Que cara de espanto é essa?
Há dúvida de que sou um objeto? Sou sim. Posso ser virtual mas não deixo de ser um objeto. Sou um objeto de lazer. Enfim, sou um objeto de lazer quando ela se lembra de passar por aqui e de deixar algum post para entreter. Ou quando me enfeita com alguma imagem. Só que ultimamente ela anda a passar pouco tempo aqui na esquina. Fico triste. Pois fico. Parece que já não me liga.
Está bem … eu só existo porque ela me criou mas, caramba, custava-lhe passar mais tempo comigo? Custava? Desculpa-se com as muitas tarefas que tem entre mãos. Diz que não tem tempo, que assim que puder me compensa e ranhánhá…ranhánhá…ranhánhá. Mas não passa disto.
E as visitas, hein? Ela esquece-se das visitas e de como é aborrecido recebê-las durante dias e dias sem estar atualizado? Um blogue tem de ter novidades. Mesmo que seja um simples bloguesinho de esquina como eu. “Tens razão… diz-me ela quando me queixo… “mas, vê bem, nem consigo passar de fugida nos blogues amigos…”
E lá me está ela a fazer aquela carinha de sofrida para que eu me comova e mais uma vez lhe perdoe. Enfim, vida de blogue é o que é. E pronto.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

A vida secreta dos objetos - o batedor de ovos



Quando ela me agarrou para bater os ovos em omeleta, bem percebi como me recriminava com o olhar questionando a minha má disposição. Que mau feitio era este que transparecia na minha expressão agastada? Ora essa… era o que mais faltava! Então havia de estar bem disposto se fazem de mim o carrasco dos meus familiares e amigos. Não se lembraram de nada melhor do que um ovo para bater nos outros ovos? Isto da imaginação humana tem muito que se lhe diga. Acham graça, não? Pois paciência se tiverem que me ver sempre de ar zangado. Porque é que não pensaram noutro boneco para assumir este papel? Não viram logo que esta era uma invenção de mau gosto? Se soubessem o sofrimento por que passo. Sou olhado de lado pelos meus amigos. Vivo só, numa gaveta cheia de outros utensílios de cozinha. Gente fria, sem alma. E de cada vez que me colocam sobre a bancada e me aprontam para a função, vejo como os ovos que vão saindo da casca para o recipiente me abominam. A minha vida não está para sorrisos. Aguentem-me.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Borbulhas

Tenho por norma nunca espremer borbulhas. Mas se fossem destas, não resistia.


Já o mencionei por aqui, mas repito. Acho imensa graça a estes objetos.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Há objectos e objetos

Isto agora começa a parecer uma salganhada. Mas o que fazer?

É que há dias comecei a tentar aplicar aqui o novo acordo ortográfico. Coisas absratas e tal.

Só que hoje acabei de aqui deixar mais uma vida secreta dos objectos, uma série que criei antes da minha famigerada decisão de me "modernizar". Como os títulos anteriores me aparecem automaticamente para copiar e ajustar e como a etiqueta também já cá está... cliquei e pronto, saiu a versão antiga. E antiga decidi que ficará, para eu poder recuperar todos os posts da série quando me apetecer.

Paciência. O acordo que conviva por aqui com o antes e o depois. E que uma ortografia não se zangue com a outra, se faz favor.

A vida secreta dos objectos - O ferro de brincar

A vida é um lugar estranho. Às vezes dou por mim a pensar como é que consegui sobreviver aos outros brinquedos dela.

Estou há anos fechado num armário poeirento que está encostado à parede da arrecadação do fundo do quintal. Por única companhia tendo tido uns livros quase tão velhinhos quanto eu. Ao menos valha-me isso. Eles são uma boa companhia. Sempre vão contando umas histórias que me ajudam a passar o tempo. Só não têm remédio para este mal da ferrugem que me atacou. O que eu tenho sofrido com esta peste! Começou com um picozinho aqui, um picozinho ali… e agora estou numa lástima. Custa-me olhar para mim e ver-me nesta agonia. Logo eu… uma imitação autêntica do verdadeiro ferro de passar Calor da Jolux. Sim…sim… sou made in France. Eu sei… ao fim de tantos anos em Portugal, já falo correctamente português e nem sotaque quase mantenho. Mas como eu ia dizendo, eu sou um ferro de brincar à séria. Aqueço mesmo. Ou aquecia… vá… Na verdade há séculos que ninguém me liga à corrente. Mas até tenho um sinal luminoso na testa!

Hoje em dia já não se fabricam ferros de brincar como eu. É tudo de plástico. No meu tempo é que era. Ela passava as roupinhas das bonecas com uma dedicação tal… até fico emocionado só de lembrar. Mas a vida é assim. Ela cresceu, arrumou-me numa caixa qualquer e trouxe-me para Portugal. Só que se esqueceu completamente de mim. Ingrata, é o que é. Nem sequer se lembrou de me passar para a filha dela. Uma vergonha! Se me tivesse dado uma segunda oportunidade de trabalho, talvez eu não tivesse chegado ao estado degradado em que me encontro. É que custo a mexer-me com esta oxidação de que sofro.

Agora, pôs-me a apanhar ar. Houve para aqui uma sessão de arrumação dos trastes velhos e retirou-me do armário. Andou comigo às voltas, pousou-me no parapeito do terraço e encostou uma máquina escura ao olho. Carregou num botão da dita máquina e ela fez um barulho esquisito. Não percebi nada daquilo. Não sei quais são as intenções dela.

Ai que ansiedade! O que poderei eu ainda esperar desta vida?


quarta-feira, 2 de março de 2011

A vida secreta dos objectos - O gato do Shrek

Alguém agarrou no pacote de cereais de chocolate e retirou-o da prateleira do supermercado. Quando colocou o pacote no carrinho e avançou corredor fora, percebi, pelo movimento deslizante, que tinha chegado a minha vez e que, em breve, iria ver a luz do dia. Acelerou-se-me a pulsação e comecei a ficar irrequieto, ansioso por me soltar do invólucro de plástico em que me encontrava.
Ainda tive de esperar algum tempo antes de ser retirado do mar de cereais de chocolate em que, até então, vivia e sobretudo da escuridão que reinava no pacote totalmente fechado.
Estava impaciente por conhecer a criança a quem eu iria pertencer. Antecipava já as cócegas que havia de sentir quando ela agarrasse nos lápis de cor ou nos pincéis e guaches para me colorir a preceito. E imaginava o reencontro com os meus amigos, eventualmente já pintados: o maluco do burro, o grande Shrek, a doce Fiona... Quantos deles já estariam à minha espera?
Quando, finalmente, fui libertado do pacote de cereais, nem queria acreditar no que via. Afinal não havia qualquer criança por ali. Quem ia comer os flocos de chocolate era um rapazola quase a chegar à maioridade.
E agora? Que destino seria o meu? Não vislumbrava quem me pudesse colorir. E continuo sem saber o que me vai acontecer. Estarei eu condenado à brancura eterna? Ah... céus... e se me deitam fora por falta de serventia? Um gato como eu não aguenta esse triste destino.
Haverá por aí alguém que me possa valer?


sábado, 12 de fevereiro de 2011

A vida secreta dos objectos - O termómetro

Até que enfim! Estava a ver que não chegava a trabalhar este Inverno. Isto de um termómetro estar no desemprego na maior parte do tempo é aflitivo. Já andava a ficar desesperado, fechado ali naquela gaveta da cómoda, entre papéis e carteiras em desuso, com não sei quantas caixas de óculos que deixaram de servir a encalhar constantemente no meu invólucro…
Mas vá lá… há três dias que entrei ao serviço, a monitorizar a febre dela. Pegou-lhe finalmente o bicho e assim sempre me dá o que fazer. Só que em breve acaba-se o trabalho e lá vou eu ficar novamente arrumado.
O que eu gostava mesmo era de ter conseguido um lugar na enfermaria do hospital. Aí sim é que um termómetro se vê realizado. Diariamente em funções, medindo febres e febrões, ai… quem me dera!
Enfim, a cada um a sua sorte. Olha, lá vem ela para mais uma medição. Deixem-me aproveitar enquanto é tempo.